Toda a gente quer um SUV, mas as carrinhas ainda continuam a ter méritos, mesmo nos elétricos. Isso ficou claro neste Teste TARGA 67 à VW ID.7 Tourer, conduzido por Francisco Mota e fotografado por João Apolinário.
Como todos se lembram (não foi assim há tanto tempo) as carrinhas foram um fenómeno na Europa e em Portugal também. A certo ponto, chegámos a ter uma oferta de carrinhas que cobria quase todos os segmentos de mercado, das mais pequenas e baratas, às maiores e mais luxuosas. Em muitos casos, as carrinhas superavam as vendas das berlinas em vários modelos, não só pela maior versatilidade que ofereciam em termos de espaço para carga, mas também pelo estilo, que muitas vezes era considerado mais elegante que a berlina correspondente. As diferenças de preço eram desfavoráveis às carrinhas, mas para os construtores a diferença nos custos de produção era praticamente nula o que fazia subir o lucro por unidade vendida.
Hiper fenómeno
Os SUV, um hiper-fenómeno, vieram tomar o lugar das carrinhas, mas também das berlinas. Foi um dois-em-um para os fabricantes, que assim, com um único modelo, conseguiam cobrir dois mercados. E sempre sem grandes aumentos nos custos de produção, pois as plataformas e mecânicas não mudaram. O que mudou foi o preço, que subiu sem que os compradores dos SUV reclamassem. Afinal, estavam a comprar um carro “maior” por pouco mais dinheiro.



Com o lançamento dos modelos 100% elétricos, o posicionamento dos SUV não mudou. Mas quando se julgava que o fim das carrinhas estava a chegar, a Volkswagen lança o ID.7 Tourer, a versão carrinha da berlina-coupé de cinco portas ID.7 que não tem adversárias no mercado, por agora. Tourer e não Variant, que a VW usa para as suas carrinhas desde 1962, uma época em que a carrinha era um veículo comercial de trabalho, ninguém falava em estilo de vida ou desportos fora de portas, atividades para as quais as carrinhas se adaptam bem.
“Igual” à berlina
A ID.7 Tourer, como variante da berlina ID.7 parte de uma base, a plataforma MEB, aqui numa interpretação de dimensões tão generosas que nem precisa de incrementos face ao ID.7, sendo iguais. Tem 4,961 metros de comprimento e 2,971 metros de distância entre-eixos. Para comparação, um Mercedes-Benz EQE tem 4,95 metros de comprimento e 3,12 metros de distância entre-eixos. A parte positiva é que os estilistas da VW conseguiram desenhar uma carrinha com as proporções convencionais deste tipo de automóvel. Além disso, retrocederam no tipo de estilo que vinham a empregar nos ID anterior, deixando o futurismo e voltando à atualidade com um aspeto final que se enquadra como uma evolução do Passat e do Golf. Uma coisa é certa, conseguiram disfarçar bem as dimensões e obter um CX de 0,25, contra os 0,23 da versão berlina.



As dimensões exteriores refletem-se no interior com muito espaço nos lugares da frente, se bem que o piso se apercebe relativamente alto, algo que se percebe ainda mais na segunda fila, com as coxas a ficarem mal apoiadas no banco. O comprimento para os joelhos é mais que generoso mas falta espaço sob os bancos da frente para os pés. A altura é boa e o acesso fácil. A largura não chega para três viajarem com conforto, só porque o banco tem um lugar central duro e alto.
Mala enorme
Os bancos de trás reclinam o que faz aumentar a capacidade da mala de 545 litros, com as costas mais reclinadas e 605 litros, com as costas mais verticais. Tem abertura elétrica do enorme portão traseiro, boca de carga baixa e enrolador da chapeleira com lugar para o guardar sob o piso da mala. A unidade que testei estava equipada com o enorme tejadilho panorâmico em vidro, que não tem cortina, mas tem um sistema que torna o vidro opaco, ao tocar num botão. A VW garante que protege contra o excesso de calor e raios UV. Não tive temperaturas suficientemente altas para o provar.



O habitáculo também segue a filosofia dos outros ID, com algum minimalismo, mas muito longe dos extremos a que outros levam esse conceito. O painel de instrumentos é minúsculo, porque há um “head up display” de série, com realidade aumentada. O ecrã central tátil tem 15” de diagonal e os “sliders” em rodapé, para a temperatura e volume de som, são finalmente iluminados. Mas a organização da informação continua pouco intuitiva, obrigando a uma adaptação e a desviar os olhos da estrada mais tempo que o recomendável.
Arrumação
A transmissão controla-se através de um comando rotativo numa haste do lado direito da coluna de direção. Não é retro-iluminada, mas liberta espaço na consola. Entre os bancos da frente, há uma “ponte” superior com dois grandes porta-objetos com tampa e, por baixo, ainda há uma generosa prateleira abertaNa porta do condutor só há dois botões para os vidros elétricos. Para operar os de trás, é preciso carregar no botão tátil “rear” antes de os usar. Uma economia de custos que já vem do ID.3 mas que faz pouco sentido neste segmento. De resto, a perceção de qualidade é razoável, com uma mistura aceitável de materiais de toque macio, no topo do tablier e portas; e outros duros mas com bom acabamento superficial. Há aplicações de efeito metálico e pele sintética com pespostos contrastantes. Um escolha de cores mais viva daria ao interior um ambiente menos “frio”.


A posição de condução é boa, com amplas regulações do volante e do banco, que é confortável e tem suporte lateral eficaz, além de regular a extensão do assento. O volante tem uma pega simples mas confortável, contudo, os seus botões hápticos facilmente se acionam por engano nas manobras. O diâmetro de viragem de apenas 10,9 metros facilita a condução em lugares apertados.
Modos de condução
Estão disponíveis quatro modos de condução: Eco/Comfort/Sport/Individual mas para os escolher é preciso entrar no infotainment. Seria muito melhor que estivessem acessíveis nos botões do volante. Além de regularem a resposta do acelerador e da climatização, ainda regulam os amortecedores adaptativos, que se podem ajustar manualmente numas exageradas quinze posições, divididas por três áreas: comfort, normal, sport. Comecei no modo Eco em cidade, que se mostrou mais que suficiente em termos de resposta do motor no meio urbano, sendo decidido mas não brusco. Os travões (tambores atrás) também são fáceis de modular e a direção está bem calibrada.



Só há dois níveis de regeneração na desaceleração, o normal e o “B” que se ativa na alavanca rotativa da transmissão. É suficiente mas patilhas com vários níveis seria melhor. O nível normal não é um “zero”, por isso não se pode aproveitar a inércia nas inclinações favoráveis. O modo B também não faz efeito “one pedal”, é sempre preciso travar. No entanto, algures numa página do infotainment há a possibilidade de ativar um modo automático que ajusta a regeneração em função da via e dos outros utentes. Funciona razoavelmente. A suspensão, independente às quatro rodas, controla bem os movimentos da carroçaria. Em bom piso, é muito confortável e só nos pavimentos estragados surgem alguns solavancos. Isto porque monta pneus 235/56 R20, na frente e 255/45 R20, atrás. Razão para a diferença é a tração ser às rodas traseiras.
Consumos baixos autonomias altas
No meu habitual teste de consumos reais em cidade, com o A/C desligado, em modo Eco e usando a função “B” de maior regeneração sempre que me pareceu útil, o consumo que registei foi de uns excelentes 11,0 kWh/100 km. Isto equivale a nada menos do que 700 km de autonomia, fazendo as contas à capacidade útil da bateria de 77 kWh. Passando à autoestrada, mantendo o modo Eco, mas ficando pelo mínimo de regeneração e mantendo o A/C desligado, o consumo que obtive foi de 17,4 kWh/100 km, equivalendo a uma autonomia real em autoestrada de 443 km. Um bom valor, a beneficiar da aerodinâmica.



Passando à autoestrada, mantendo o modo Eco, mas passando ao mínimo de regeneração e mantendo o A/C desligado, o consumo que obtive foi de 17,4 kWh/100 km, equivalendo a uma autonomia real em autoestrada de 443 km. Um bom valor, a beneficiar da aerodinâmica, que gera muito poucos ruídos, tal como os de rolamento e de motor.
Novo motor
O motor elétrico é novo. Continua a utilizar ímanes permanentes no rotor, mas são mais potentes para melhor lidar com a subida de temperatura nas acelerações. O estator tem maior quantidade de fio bobinado e o sistema de arrefecimento foi melhorado. Tudo isto para reduzir consumos e ainda conseguir subir dos 204 para os 286 cv. O motor elétrico tem número de código APP550, tendo sido projetado pela própria VW, integrando o inversor e a relação de transmissão única às rodas traseiras. E nem sequer ocupa muito espaço.



Passei ao modo Sport, modo Sport também no ESC e segui para uma boa estrada secundária, aí descobre-se um ID.7 Tourer de que não se está à espera, sobretudo para quem não guiou a versão berlina. A Tourer não evidencia diferenças a nível dinâmico. A aceleração anunciada é de 6,6 segundos, só mais 0,1 segundos que a berlina e um valor bom.
Dinâmica surpreende
A direção ganha um pouco de “peso” mas nada demais e os amortecedores sobem um pouco de taragem, mas não vão ao máximo, nem precisam. Numa travagem forte ao fim de uma reta relativamente longa, os travões podiam ter uma resposta inicial mais incisiva, mas dão conta do recado. Entrando depressa em curva, os pneus da frente não entram em subviragem facilmente, permitindo uma velocidade alta durante a curva, com bom controlo lateral e pouca inclinação.



Mas o que surpreende na dinâmica vem logo a seguir. Depois de entrar neutro em curva, o ID.7 Tourer passa a ligeiramente, mas consistente sobrevirador, o que não é nada típico de um VW. É uma deriva discreta, que ajuda a fazer rodar o carro sem “acordar” o ESC e nem precisa de correções, mas que se torna divertida.
Conclusão
Tal como na berlina, a Tourer do ID.7 é o melhor elétrico da Volkswagen, neste momento. Tem espaço, qualidade, estilo VW, boa autonomia e uma dinâmica divertida que surpreende. Há algumas questões ergonómicas que mereciam revisão, mas pouco mais.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
VW ID.7 Tourer Pro Urban
Potência: 286 cv
Preço: 61 828 euros
Veredicto: 4 estrelas
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