O novo CLE substitui dois modelos, uma tarefa mais fácil que o previsto. Sobretudo porque segue uma via tradicionalista, que ainda tem muito para agradar. Descoberta de prazeres tradicionais em mais um Teste TARGA 67, conduzido por Francisco Mota e fotografado por João Apolinário.
A primeira sensação que tive ao entrar no novo Mercedes-Benz CLE 200 Cabrio foi de conforto. Não o conforto dos bancos ou da suspensão, mas o conforto de regressar a um tipo de automóvel que conheço bem há várias décadas. Um descapotável de luxo com quatro lugares, tão capaz num passeio pelo campo, como numa utilização quotidiana em cidade. Por um lado, senti alguma desilusão porque o conceito evoluiu muito pouco nos últimos vinte anos. Mas o tal conforto, de voltar a um tipo de carro que me é familiar e que sei o quanto competente pode ser, acaba por tornar a experiência cativante.
Um por dois
Nos tempos em que os SUV não dominavam tudo e havia clientes para os mais variados tipos de carros, a MB tinha um coupé/descapotável na Classe C e outro duo semelhante na Classe E. Ambos com quatro lugares e, nos cabrios, com tetos de lona de alta qualidade. Mas a procura por estes dois modelos paralelos decresceu e a MB tomou a decisão lógica: substituir os dois modelos por apenas um, posicionado algures entre os dois. Nasce assim o novo CLE, feito com base na plataforma do Classe C, mas com dimensões estendidas para dar resposta a quem procura um Cabrio com quatro verdadeiros lugares. Tem 4,85 m de comprimento e 2,87 m de distância entre-eixos.
No estilo, preferiu também o conservadorismo a aventuras que poderiam correr mal. O CLE Cabrio partilha partes do desenho dos atuais Classe C e Classe E, resultando numa silhueta muito elegante onde o tejadilho de lona faz o seu teatro, quando se carrega no botão que aciona a abertura/fecho através de um conjunto de motores elétricos. A tarefa pode ser feita com o CLE em movimento, a baixa velocidade, o que pode ser útil.
4 verdadeiros lugares
O habitáculo tem tudo aquilo que se espera dos melhores Mercedes-Benz. Mas é aqui que o tradicionalismo dá lugar à modernidade, através do painel de instrumentos digital configurável de 12,3” de diâmetro e, principalmente, do monitor tátil central de 11,9” que ocupa toda a consola, na vertical. É dos mais fáceis de consultar e de utilizar que conheço, com ícones grandes e rápidos. Em rodapé, tem um friso de ícones digitais para a climatização que estão sempre presentes, substituindo bem as teclas físicas antigas. E mais abaixo tem poucos botões físicos, um deles para regular a inclinação do próprio monitor.
Continuando na ergonomia, o volante agrada menos, pois tem dois minúsculos botões hápticos para comandar o painel de instrumentos e o monitor tátil. Além de pequenos, são difíceis de usar com os polegares, mesmo em funções simples como consultar ou fazer “reset” do computador de bordo. A alavanca da caixa é uma fina haste na coluna de direção que se opera com enorme facilidade. De resto, permanece a ideia da haste única do lado esquerdo, com excesso de funções, como sempre na MB.
Qualidade de topo
A consola entre os bancos tem alguns porta-objetos úteis, mas podiam ser um pouco mais volumosos. Os bancos da frente são muito confortáveis, com muitos ajustes e com bom apoio lateral, contribuindo para uma excelente posição de condução, pois tanto os pedais como o volante, de pega anatómica, estão bem posicionados uns em relação aos outros e têm regulações amplas, feitas nas portas, como é tradicional na MB. Também tradição é a qualidade de topo no segmento, que se mantém com muitos materiais de alta qualidade e detalhes como o desenho dos altifalantes ou as saídas da climatização inspiradas nas turbinas dos aviões.
Para os dois lugares de trás, o acesso não é muito difícil, pois os bancos da frente deslizam para diante mediante motores elétricos. Sair, com a capota fechada é um maior desafio… O espaço disponível atrás é razoável em comprimento e altura e generoso em largura, pois só há dois lugares. Ao meio está um túnel central bastante alto. Também aqui o conforto dos bancos se mantém, apesar de as costas serem bastante verticais, mostrando que o CLE é um verdadeiro quatro lugares.
Em cidade
Estão disponíveis os habituais modos de condução: Eco/Comfort/Sport/Individual, que ajustam a resposta do acelerador, assistência da direção, rapidez da caixa automática de 9 relações e controlo de estabilidade. A suspensão usa amortecedores passivos e molas metálicas, sendo independente às quatro rodas. Em cidade, a primeira sensação vem do muito baixo nível de ruído deste motor 2.0 turbo a gasolina, (sendo um som vulgar) que debita 204 cv e 320 Nm. A caixa é ultra-suave e faz as mudanças na altura certa, desde logo usando o modo Eco, que se mostrou o melhor calibrado para o meio urbano. Mais suave e com resposta mais que suficiente. Há um sistema “mild hybrid” mas cujo efeito é muito difícil de sentir, o que é pena, pois este motor até precisava de mais ajuda.
A direção é um pouco assistida em excesso, mas nada que importune realmente, tanto mais que é precisa e isenta de vibrações. Os travões, não são muito progressivos em cidade e têm um tato demasiado macio, não disfarçando os 1715 kg, quando é preciso uma travagem mais violenta. É que, tratando-se de um cabrio, o que se perde me peso do tejadilho é mais do que compensado por reforços de estrutura, nomeadamente no aro do para-brisas, nas embaladeiras e no piso. O trabalho foi bem feito, pois só se notam algumas vibrações estruturais em piso degradado, que chegam ao condutor pelo banco, não pelo volante.
Pneus exagerados
A suspensão tem uma afinação relativamente desportiva e os pneus são de medida 245/35 R20, na frente e 275/30 R20, atrás. São pneus muito exagerados para a performance disponível e penalizam claramente o conforto quando o piso tem irregularidades de alta frequência, ou seja, buracos e lombas onduladas. Em bom piso, e mesmo sobre passadeiras elevadas, não há problema. Mas nas bandas sonoras é mesmo preferível ir devagar.
A condução em cidade é um pouco dificultada pela visibilidade, com a capota erguida, tanto para trás como para os ¾ dianteiros, devido aos pilares e retrovisores. Mas o raio de viragem não é exagerado e não faltam câmaras para dar uma ajuda. No meu habitual teste de consumos reais em cidade, com o modo Eco, caixa sempre em D e A/C desligado, obtive um valor de 8,0 l/100 km.
Tudo fácil
Passando à autoestrada, usando a mesma configuração, rolando a 120 km/h constantes, o consumo real é de 6,3 l/100 km. Em ambos os casos, os testes foram feitos com a capota e vidros fechados. O modo “vela”, em que a caixa é posta em ponto-morto, deixando a inércia tomar conta do avanço, entra com frequência em troços planos ou ligeiramente a descer.
O comportamento em autoestrada é o que se espera. Confortável e bem controlado pela suspensão e pelos pneus sobredimensionados. O motor não é o ponto alto deste CLE 200 Cabrio, mas cumpre as expetativas, com boa resposta a todos os regimes e capaz de velocidade máxima de 240 km/h. A Mercedes-Benz melhorou soluções aerodinâmicas de proteção dos passageiros que já tinha no passado. Estou a falar de defletor no topo do para-brisas, que se eleva ao carregar num botão elétrico e que desvia o fluxo de ar do habitáculo.
Sem turbilhões
O CLE não fica com o melhor dos aspetos, mas a solução resulta, sobretudo em conjunto com a rede colocada entre os encostos de cabeça dos lugares de trás, que também tem acionamento elétrico e é mais alta do que o habitual. A 120 km/h, quase não há turbilhões nos lugares da frente ou nos de trás. Um detalhe tradicional é o compartimento para guardar a capota, dentro da mala, que se pode rebater, quando a capota está erguida, obtendo assim uma capacidade da mala de 420 litros.
Faltava testar o CLE 200 Cabrio numa estrada secundária com as curvas necessárias. É certo que não se trata de um desportivo, longe disso. A sua missão é proporcionar passeios de cabelos ao vento e isso faz com imensa competência, mesmo quando se decide baixar todos os quatro vidros, num botão único, para usufruir da experiência cabrio ao máximo. Baixar a velocidade e aproveitar o Sol, o vento e os aromas do campo, é algo que nunca passa de moda.
Em modo Sport
Mas, passando ao modo Sport e aumentando o ritmo, o CLE 200 ganha outro vigor. É certo que o quatro cilindros turbo não é um espanto de força, nem de resposta a baixo regime. A caixa automática ajuda-o imenso com a sua rapidez, precisão e obediência, quando se usam as patilhas. Com tudo isso, consegue anunciar uma aceleração 0-100 km/h de 7,4 segundos o que está longe de ser inadequado. É possível manter um ritmo rápido sem ter que usar rotações muito altas, graças aos 320 Nm.
A direção não é muito rápida e está um pouco filtrada, mas dá suficiente “feedback” da estrada. A suspensão da frente resiste muito à subviragem, com a preciosa ajuda dos pneus. Há alguma inclinação lateral em curva, também porque os pneus geram imensa aderência e, depois, à saída das curvas mais lentas, não vale a pena tentar “brincar” com a tração traseira, pois a tração muito alta não deixa a traseira rodar. A não ser que se use uma condução exagerada ou se desligue o ESC em piso muito escorregadio. Nessas situações, a sobreviragem nem sempre ocorre da maneira mais progressiva.
Conclusão
Sem inovar, o CLE 200 Cabrio mostra como um conceito com muitos anos continua a funcionar na perfeição, para quem aprecia um descapotável de alta qualidade e quatro lugares. Sobretudo no Outono, uma das melhores alturas do ano para os guiar. Tem os mesmo méritos e os mesmos contras que sempre teve, melhorando ambos um pouco. Veremos se a fórmula tem futuro e que benefícios ganhará quando for equipada com uma verdadeira motorização híbrida, ou elétrica…
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
Mercedes-Benz CLE 200 Cabrio
Potência: 204 cv
Preço: 71 400 euros
Veredico: 4 estrelas
Ver também, seguindo o Link:Teste – Mercedes-Benz E220d: O regresso de um clássico