A segunda geração do Mercedes-AMG GT 63 4MATIC+ ficou menos rebelde ao receber tração às quatro rodas e quatro lugares. Mas o motor V8 continua a encantar pelo som e pela raça como ficou provado em mais um Teste TARGA 67, conduzido por Francisco Mota e fotografado por João Apolinário.

A anterior geração do Mercedes-AMG GT tinha um caráter muito especial, em grande parte devido ao seu portentoso motor V8. O som, a vibração, o desempenho e o seu aspeto quando se abria o capôt, não podiam deixar de apaixonar todos os que gostam de super desportivos. Era um dois lugares, tinha algumas falhas de ergonomia – como a posição recuada da alavanca da caixa – mas quando se ligava a ignição tudo isso passava para segundo plano. Muitas vezes apontado como rival do Porsche 911, a verdade é que o AMG GT tinha uma atitude muito diferente. Muito mais rebelde, ligeiramente intimidante quando a tração atrás pintava duas largas riscas negras no asfalto, enquanto a longa frente baralhava um pouco as sensações que vinham das rodas dianteiras.
Menos sustos
Talvez fosse demais para alguns clientes, que apreciavam o V8, mas não queriam apanhar sustos a cada curva em que decidiam carregar mais no pedal da direita. Talvez por isso a AMG tenha decidido equipar a segunda geração com tração às quatro rodas de série e aumentar 19 cm o comprimento, atingindo os 4728 mm e 2700 mm de distância entre-eixos (mais 7 cm) além de 1984 mm de largura. Por isso, no habitáculo há quatro lugares. Ao mesmo tempo, aproveitou para atualizar o estilo e a tecnologia dos interiores, alinhando o GT 63 com os outros modelos de topo da Mercedes-Benz. O resultado não surpreende quem conhece alguns desses outros modelos, a ergonomia melhorou da noite para o dia.

Mas comecemos pelo princípio. O AMG GT mudou para uma nova plataforma, partilhada com a última geração do SL e feita numa mistura de aço, alumínio, fibra de carbono e magnésio, cada um usado nos pontos mais convenientes. Depois, há as ajudas mecânicas à condução a começar pela direção variável e pela direção às rodas de trás, que viram num máximo de 4,5 graus para cada lado. Abaixo dos 100 km/h, viram para o lado oposto ao das da frente, e no mesmo sentido, acima dos 100 km/h. A suspensão multibraço às quatro rodas usa braços de alumínio, tem amortecedores com os elementos hidráulicos interligados em “X” (frente direito com traseiro esquerdo e frente esquerdo com traseira direito) e barras estabilizadoras ativas. Tem três níveis de amortecimento e de conforto. Os travões têm discos de aço, com cubos em alumínio, com maxilas de seis êmbolos.
Novidade: 4Matic+
A transmissão 4Matic+ é uma das maiores novidades no GT, usando uma embraiagem eletrónica para distribuir o binário entre os dois eixos. Na maioria das vezes, só a tração traseira trabalha, mas quando é preciso, entra em ação a tração também às rodas da frente até um limite máximo de 50% de binário por eixo. Este sistema tem vários modos de funcionamento, entre eles um modo “Drift” só com tração traseira. E nem falta um diferencial autoblocante eletrónico traseiro. A caixa é uma automática de nove relações com embraiagem viscosa. Esta unidade está equipada com o pacote AMG Dymanic Plus que inclui o autoblocante, maxilas de travões amarelas, suportes dinâmicos no motor, aerodinâmica ativa, splitter e pode ter asa traseira fixa, que não é o caso aqui.




No capítulo da aerodinâmica, há dispositivos móveis, como é o caso da asa traseira que se ergue acima dos 80 km/h, podendo adotar cinco ângulos de ataque diferentes, dependendo da velocidade e do modo de condução escolhido. Abaixo do para-choques da frente há um splitter que baixa 40 mm também acima dos 80 km/h, para compensar o efeito de downforce da asa traseira na zona posterior e assim equilibrar a distribuição de carga aerodinâmica entre os dois eixos. Ainda existem cortinas móveis na grelha da frente, horizontais e verticais, que só abrem se o motor precisar de arrefecimento extra, sendo que as verticais só funcionam acima dos 180 km/h.
V8 retocado
O motor V8 foi mantido no GT63, mas a AMG não seria a AMG se não o fizesse evoluir, até para lhe baixar as emissões de CO2 e contribuir menos para a média de dióxido de carbono da marca. Assim, o V8 biturbo 4.0 recebeu um novo cárter seco, novo intercooler, a já referida ventilação ativa, coletores de admissão e escape, maior pressão na turboalimentação, mais caudal de ar de admissão e um software revisto. Tem também a hipótese de escolher entre dois sons, com diferentes graus de reforço sintetizado. O resultado é uma potência máxima de 585 cv (mais 63 cv que o GT S da geração anterior) e binário máximo de 800 Nm (mais 150 Nm que o GT S anterior) entre as 2500 e as 4500 rpm. Com tudo isto, o peso vale 1970 kg, mais 325 kg que o GT S.



A posição de condução continua muito rente ao chão, com o capôt a mostrar bem as duas bossas. Não senti tanto que vá sentado ao nível das rodas de trás, como no antecessor, vou mais próximo do centro do carro. Muita amplitude de regulação do banco, um pouco firme mas com excelente apoio lateral; e do volante, que tem uma pega magnífica e uma série de botões a que é preciso dar atenção. Além dos habituais botões hápticos para as funções normais, distribuídos por quatro braços horizontais e difíceis de usar, ainda há as patilhas para a caixa e dois botões redondos destacados dos braços. Um serve para memorizar duas funções à escolha do condutor, por exemplo o som do motor e a posição da asa traseira. O botão da direita serve para memorizar modos de condução como o Race. A alavanca da caixa está na coluna de direção, libertando espaço na consola.






Quanto aos dois bancos da segunda fila, com apenas 1,5 metros de altura disponível, são mais adaptados a crianças, até porque o acesso não é fácil. Podem rebater-se em duas partes iguais fazendo subir a capacidade da mala que vale 321 litros. O acesso à mala é muito fácil, devido às generosas dimensões do portão traseiro.
Não falta nada
Os amortecedores adaptativos, no nível mais confortável do modo Comfort, fazem um excelente trabalho sobre piso relativamente estragado. Mas quando a qualidade do pavimento piora muito, é lógico que tudo se torna mais firme, gerando alguns ruídos parasita. Até porque esta unidade está equipada com pneus 295/30 R21, na frente e 305/30 R21, atrás. Há a opção de jantes 20”, com diâmetro externo dos pneus igual, que deve acrescentar comodidade. A direção tem a assistência correta, não tão “pesada” como na geração anterior. Mas é estranho que o raio de viragem seja tão grande (12,5 m) mesmo com a direção às rodas de trás. A caixa automática é suave o suficiente em cidade e o motor, mantendo o modo Comfort, entrega o binário de forma progressiva e até ligeiramente preguiçosa, a regimes muito baixos. É um biturbo, mas não tem ajuda híbrida, é bom não esquecer.






No meu habitual teste de consumos reais em cidade, com A/C desligado e em modo Comfort, obtive um consumo de gasolina de 15,5 l/100 km. Nada de espantar, tendo em conta o tipo de motor usado, mesmo com o stop/start. Quanto ao consumo em autoestrada, a 120 km/h estabilizados, nas mesmas condições de modo de condução e aproveitando o modo vela, o consumo desceu a uns muito razoáveis 9,5 l/100 km. Claro que, em estradas secundárias com uma condução rápida, os consumos sobem. Neste teste, chegou aos 37 l/100 km, num troço de 32 km, muito sinuoso, feito bem “depressinha”.
Também um estradista
A condução em autoestrada, em modo Comfort, oferece um movimento vertical da suspensão suficiente para não ser classificada como desconfortável. Mas as bossas e as lombas, mesmo muito subtis, geram alguns solavancos aos ocupantes. O som do V8 é uma banda sonora que quase dispensa a música, fácil de selecionar no monitor central de 11,9”, tal como todas as outras funções, já que os botões táteis são grandes e fáceis de encontrar. Em rodapé, os botões do mesmo tipo para a climatização estão sempre visíveis e, mais abaixo, há um friso de botões físicos, um deles para ajustar a inclinação do monitor. Velocidade máxima anunciada de 315 km/h




O condutor tem ao seu dispôr nada menos do que seis modos de condução: Escorregadio/Comfort/Sport/Sport+/Race/Individual. Cada um dos quatro modos de condução intermédios faz variar a resposta do acelerador, dureza do amortecimento, ESC, direção e autoblocante. O ESC tem três posições: On/Sport/Off. Havia aqui muito por onde escolher, quando cheguei a uma estrada secundária com uma boa seleção de curvas, mas não demasiado estreita, pois o GT63 é um carro largo que exige espaço. Sem perder muito tempo com os modos de condução intermédios, passei diretamente para o Sport+, com o ESC em modo Sport.
0-100 km/h em 3,2 s
Uma primeira aceleração a fundo desde parado mostrou que o V8 está cada vez melhor. A resposta ao acelerador é tão imediata que mais parece ser atmosférico, só se percebe que tem dois turbos porque a curva da velocidade máxima desce logo às 6500 rpm. A AMG anuncia uma aceleração 0-100 km/h em 3,2 segundos, o que pareceu perfeitamente realista. A tração às quatro rodas tem responsabilidade na perfeita tração quando as rodas recebem as oito centenas de Newton x metro sem desperdiçar um que seja; e as patilhas da caixa mantêm uma continuidade excelente no fluxo de potência. A direito, guiar o GT63 a fundo já é um acontecimento!



Não é a potência máxima que cativa, numa altura em que vários elétricos fazem o mesmo ou melhor. É o som, a vibração, as fulminantes passagens de caixa. Um conjunto de sensações que um EV terá dificuldade em imitar. Se acelera bem, não trava pior, pois os discos de 350 mm, na frente e 320 mm, atrás permitem travagens potentes, resistentes e fáceis de dosear. Só pedem alguma força à perna direita. A suspensão mantém o GT63 muito estável, com pouca inclinação no eixo longitudinal ou transversal, permitindo uma entrada em curva rápida e precisa. Nota-se menos o efeito desconcertante da frente muito longa do modelo anterior.
Mais acessível
Talvez por segurança, quando se leva demasiada velocidade para dentro de uma curva média, surge um pouco de subviragem. Mas é uma atitude que apenas inspira confiança, de correção fácil e imediata e que serve para estabelecer os limites de aderência. Continuando a acelerar, a 4Matic+ encarrega-se de passar mais força para as rodas traseiras que assim invertem a atitude do GT63, fazendo-o rodar à custa de um pouco de sobreviragem bem medida, em que o ESC mal se intromete. No global, um comportamento igualmente envolvente, mas mais acessível a mais condutores que o modelo anterior.



Passando ao modo Race e desligando o ESC por completo, o sistema limita as escolhas às hipóteses mais radicais do acelerador, suspensão, direção e autoblocante. O GT63 ganha outra agressividade, sobretudo na maneira como o autoblocante de duas embraiagens funciona, mais rápido a passar potência entyreas rodas traseiras e com a embraiagem central a passar mais potência para trás, para a sobreviragem surgir de forma mais imediata. É um modo que exige mais atenção e decisões mais rápidas do condutor, mas que retribui com um gozo de condução superior, sem nunca ter sentido que estava a guiar nos limites do desastre.
Conclusão
A AMG soube tornar o GT63 num superdesportivo mais acessível de guiar depressa para mais condutores, sem perder nada da personalidade do modelo. A tração às quatro rodas só traz benefícios, mesmo em condução extrema. E os dois bancos suplementares, mesmo sendo muito acanhados, podem ter alguma utilidade. De resto, é realmente o motor V8 que “faz” este GT63 4Matic+.
Francisco Mota
Mercedes-AMG GT 63 4Matic+ Coupé
Potência: 585 cv
Preço: 258 850 euros*
Veredicto: 4,5 estrelas
(*sem opcionais)
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