Novidade – Ford Blue Cruise: Sem mãos, sem pés…

A Ford acaba de introduzir no mercado português a sua tecnologia de condução autónoma mais avançada que foi homologada para a Europa. Fomos experimentá-la e sentámo-nos ao volante do Mustang Mach-E para nos deixarmos transportar pelo nosso “chauffeur” BlueCruise, cujo lema é “hands-off, eyes-on”. Explicamos porquê.

A Ford demonstrou, em território nacional, o funcionamento do seu sistema de condução autónoma mais avançado que homologou para a Europa, o BlueCruise. A tecnologia já está aprovada para utilização em Espanha, na Alemanha e no Reino Unido desde 2023 e chega agora a Portugal. É uma espécie de “Nível 2 Plus”, aponta a marca.

Como funciona?

Esse novo patamar de condução da Ford recorre a oito câmaras e radares, combina três tipos de tecnologia (Cruise Control Adaptativo Inteligente com Stop-and-Go; Assistência à Manutenção na Faixa de Rodagem; e Reconhecimento de Sinais de Velocidade) e orienta-se por um mapa especialmente desenhado pelos engenheiros da própria marca. Esse mapa serve de “carril virtual” para guiar o Mustang Mach-E, único modelo Ford em que este sistema de condução autónomo está disponível, por enquanto.

4100 km em Portugal

As vias que estão abrangidas neste mapa Ford são autoestradas e vias rápidas com separador fixo a dividir as faixas de rodagem nos dois sentidos. Neste momento, o mapa inclui 133 mil quilómetros de troços na Europa, dos quais mais de 4100 km são em Portugal. São as “Blue Zones” ou “Zonas Azuis com Mãos-Livres”. “O Ford BlueCruise foi aprovado pela Comissão Europeia para ser utilizado pelos condutores do novo Mustang Mach-E em mais 15 países europeus”, acrescenta a marca.

Quando deteta, através da navegação GPS, que está a entrar num desses troços (e desde que o cruise control adaptativo esteja ligado), a viatura “passa para o comando das operações” (o painel de instrumentos fica todo azul e informa o condutor).

Esse assumir do “comando das operações” significa que o veículo acelera, abranda, mantém a distância para a viatura da frente, de acordo com o que definimos, e curva com o condutor a ter os braços cruzados, como comprovámos e fizemos. Assim que se desejar, cancela-se o modo autónomo, pressionando um botão no volante – o cancelamento também ocorre assim que se leva o pé ao travão ou se mexe no volante.

Mas não é isso que outros fazem?

Nos EUA, até estão em circulação automóveis com sistemas de condução autónoma mais avançados (robotaxis de Nível 4), devido à maior abertura da legislação e das autoridades norte-americanas. Na Europa, onde as normas são mais restritivas, os sistemas autónomos homologados são mais contidos e, por regra, a maioria são de Nível 2 no espaço europeu, embora haja casos de veículos de série autorizados com Nível 3 (na Alemanha, por exemplo, Mercedes-Benz e BMW obtiveram o “ok” para os disponibilizar ao público nos seus países de origem – Drive Pilot Level 3 da Mercedes-Benz e BMW Personal Pilot L3).

Neste caso, o sistema da Ford (aprovado em março último pelo Comité Técnico dos Veículos a Motor, Technical Committee on Motor Vehicles – TCMV, da EU) caracteriza-se pelo maior tempo de duração em que o modo autónomo pode estar “on” para permitir que o carro role “sozinho”. Isto leva a que, teoricamente, um condutor com esta tecnologia possa ir na A2, de Lisboa ao Algarve, praticamente, sem usar (ou sequer tocar) no volante, nem no acelerador. Com duas condições: desde que não saia da sua via, já que se precisar de ultrapassar, o sistema desliga-se e terá de ser o condutor a fazer essa manobra, podendo depois retomar a via para prosseguir em modo automático.

Condições exigidas

Outra condição: o condutor não pode desviar o olhar da frente mais do que cinco segundos (virando, por exemplo, o pescoço para o lado). Isto porque o sistema não está homologado para substituir a atenção e a responsabilidade do condutor. Para tal, existe uma câmara virada para o condutor na zona do volante que monitoriza o seu olhar (mesmo com óculos de sol postos) e a posição da cabeça para ajudar a garantir que os olhos do condutor permanecem na estrada. É, por assim, dizer “a prova de vida” que é exigida a quem está ao volante. Daí que o fabricante refira: “Sem mãos, sem pés, mas com os olhos na estrada” (o tal “hands-off, eyes-on”). Se o condutor se mantiver alheado, o sistema “sacode” o automobilista, fazendo três travagens acentuadas para o condutor despertar. Se continuar a não haver reação, a velocidade de rolamento vai sendo sucessivamente reduzida.

Teste na CREL e A16

Testámos este sistema na A16 e na CREL, duas estradas da Grande Lisboa, que fazem parte deste “mapa azul” autónomo traçado pela Ford. No entanto, por uma decisão da marca, em zonas como nós de acesso e saída, túneis com mais de 10 metros e aproximação de portagens (e a A16 e a CREL têm muitos destes cenários), o sistema desliga-se e pede ao condutor que tome conta do volante, o que fez com que neste test drive com o Mach-E tenhamos tido o “BlueCruise” a intervir de modo intermitente. Entendemos que numa situação destas, de sucessivo liga-desliga-liga, não compensa ter esta navegação autónoma ativada, pois revela-se mais stressante do que o stress que pretende evitar ao condutor.

Consideramos que esta tecnologia será mais conveniente para uma viagem longa, por autoestrada, com pouco trânsito, já que permite que o condutor esteja mais descontraído e apresente menores níveis de fadiga. Exemplos práticos do que a tecnologia nos permite fazer: ir de Lisboa a Albufeira pela A2 sempre com o “BlueCruise” a funcionar em 96% da extensão da viagem. A viagem Lisboa-Porto consegue ser percorrida em 92% da extensão neste modo autónomo.

Chuva e neve

Nesta fase de desenvolvimento, sob forte chuva ou neve, a tecnologia fica desativada, o que é pena, pois são das situações que causam maior cansaço no condutor. Talvez numa geração futura isso seja contemplado. Mas mesmo com alguma chuva, o sistema diz presente (como comprovámos, pois, o dia em que realizamos o test-drive era de aguaceiros). De momento, na Europa, esta tecnologia da Ford, BlueCruise, pode ser ativada apenas nos modelos novos Mustang Mach-E 24MY. Os proprietários de veículos Mustang Mach-E de versões anteriores poderão vir a ter essa possibilidade, pois os Mustang Mach-E MY23 na Europa possuem hardware BlueCruise de fábrica, mas necessitarão de uma futura atualização Over the Air para instalar o software mais recente.

Este serviço será gratuito durante um período de 90 dias, após o qual os clientes podem subscrever ou cancelar o BlueCruise. Quem desejar, terá de pagar 24,99€ por mês. Não há períodos de fidelização. O condutor poderá subscrever mês a mês. Um exemplo: se for de férias em agosto e prever utilizar essencialmente autoestradas, pode entender ser útil subscrever o serviço apenas nesse mês em específico. A subscrição e o cancelamento do serviço são sempre feitos através da App da Ford.

E é seguro?

Na conferência de imprensa que se seguiu ao nosso test-drive, a marca quis destacar que a tecnologia só entrou ao serviço pelo facto de estar super testada e ser segura, existindo mais de 420.000 veículos equipados com BlueCruise nas estradas de todo o mundo, distribuídos por modelos Ford e Lincoln, que percorreram, globalmente, mais de 342 milhões de quilómetros, totalizando mais de 3,1 milhões de horas de condução.

Contudo, a ETSC – European Transport Safety Council é mais prudente e diz estar “muito preocupada” que esses sistemas de Nível 2 ‘sem interferência’, “não tragam benefícios de segurança e sejam ainda mais propensos a causar distração do motorista do que os sistemas atuais porque os sistemas ‘hands-off’ incentivam a sensação de que o veículo está em controle total, quando não está”.

Do contacto que tivemos, a tecnologia pareceu-nos segura, mas a nossa opinião é que este tipo de preocupações da ETSC tem mais que ver com o uso que é feito da tecnologia do que com a tecnologia propriamente dita. E são preocupações que podem ser atenuadas com workshops (que podiam ser obrigatórios) que sensibilizem e demonstrem o funcionamento do sistema aos clientes.

E que deixem claro que o imperativo, legal e tecnológico, de exigir que o condutor esteja atento é o que faz com que esta assistência à condução BlueCruise seja Nível 2 e não seja Nível 3. No Nível 3 o condutor pode legalmente desviar a sua atenção da estrada e, em determinadas condições, o fabricante do sistema pode ser responsabilizado por eventuais acidentes. Não é o caso do BlueCruise. Se a mensagem ficar clara na mente dos utilizadores, estas pertinentes preocupações esbatem-se.

Conclusão

No início, há sempre algum receio sobre se o sistema vai funcionar em todas as situações, designadamente curvas e velocidades mais elevadas, mas à medida que se percorrem mais quilómetros com o Mach-E, a tecnologia, que está programada para funcionar até 135 km/h, vai-nos transmitindo confiança. Apenas numa vez em que estávamos a fazer uma curva para a esquerda em autoestrada, optámos por agarrar o volante por termos considerado que o nosso veículo se estava a aproximar demasiado da viatura que circulava mais à direita. Possivelmente, a máquina iria fazer a leitura correta dos acontecimentos, mas, por uma questão de precaução, abortámos, nesse instante, a condução autónoma. Mas acreditamos que, com uma utilização mais intensiva estes receios, que também nós experimentámos, se vão esbatendo.

Paulo Marmé

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