Um Golf com um motor 1.0 TSI de três cilindros a gasolina? Será suficiente para um familiar compacto? O ceticismo é incontornável, sobretudo para quem ainda classifica os motores a combustão pela cilindrada. Mas o teste TARGA 67, veio mostrar que a Volkswagen sabe o que está a fazer, com uma versão que é capaz de surpreender.
Desde a sua apresentação à imprensa internacional em 2019, num evento que decorreu nas estradas do vale do Douro, que esperava pela oportunidade de testar a versão com o motor menos potente da gama Golf. Na altura do lançamento não estava pronto e depois o importador nacional, a SIVA, nunca o teve disponível para testes de imprensa.

Numa altura em que esta oitava geração do Golf já caminha para o seu quarto ano de vida, chegou então a altura de testar o Golf 1.0 TSI no nível de equipamento Sportline, que é a versão menos equipada, com caixa manual de seis velocidades. E sem muitos opcionais e disponível para entrega imediata, que agora se tornou num atributo relevante.
Muito discreto
Os faróis muito baixos e a sobrancelha de LED que faz de luz de dia identifica imediatamente a oitava geração do Golf. A fisionomia é uma evolução da geração anterior, como sempre foi desde o primeiro Golf de 1974. Mas nunca o Golf pareceu tão volumoso, tão arredondado.

Claro que não perdeu o pilar trapezoidal traseiro largo e sem terceiro vidro, um detalhe que sobrevive desde o início, nem o tejadilho relativamente horizontal, mantendo uma silhueta de “hatchback” puro, sem querer piscar o olhos aos coupé.
T-Roc já o ultrapassou
O Golf que não é um carro pequeno, medindo 4,28 metros de comprimento, tudo a bem do espaço interior que as famílias procuram num compacto como este. Só que as famílias continuam a fugir para os SUV, neste caso para o T-Roc, que já ultrapassou o Golf nas vendas europeias.

Mas um Golf é um Golf e isso quer dizer tudo, ou nada. Mesmo sem ter aquele ar intemporal de gerações anteriores, que pareciam tão frescas no fim da carreira como no primeiro dia, o oitavo Golf é discreto e não levanta polémicas.
Espaço suficiente
Os 2,62 metros de distância entre-eixos dão-lhe bom espaço para as pernas na segunda fila de bancos, o tal tejadilho horizontal dá-lhe portas altas que facilitam o acesso e muito espaço em altura. A largura não é um problema, mas o lugar do meio é mais estreito que os outros, mais alto e o piso tem um considerável túnel que atrapalha.

A mala tem 381 litros e um formato muito fácil de aproveitar, além de ter um piso móvel, sob o qual há um enorme espaço para esconder objetos, já que a roda suplente não é fornecida de série. Mas devia ser.
Boa qualidade
Nos lugares da frente, há também muito espaço e os bancos têm regulações muito amplas. Um Golf é para todas as estaturas de condutor. Os materiais do interior seguem a norma dos melhores do segmento, com plásticos macios na metade superior do tablier e das portas de frente. Os restantes são duros, mas com bom aspeto e não fazem ruídos parasitas.

A posição de condução é muito boa, a coluna de direção é pouco inclinada o que coloca o volante no ângulo ideal. O aro é suficientemente anatómico e confortável. Ao banco falta um pouco de apoio lateral, mas nesta versão não seria de esperar por bancos desportivos.
Ergonomia com falhas
O painel de instrumentos digital é fácil de ler e de utilizar nas suas várias formas de fornecer informação. Mas o mesmo não posso dizer do ecrã tátil central, que merece as críticas que lhe faço desde o dia em que foi lançado: organização pouco intuitiva obriga a demasiados passos para encontrar a informação que se procura, obrigando a desviar os olhos da estrada durante demasiado tempo. A VW já prometeu que vai rever este componente.

Mais abaixo há alguns pequenos botões de atalhos, mas o comando da climatização está algures dentro do infotainment o que dificulta a sua utilização. Nesta versão não há modos de condução para o condutor escolher, mas já veremos o que isso implica.
Caixa manual de 6
A caixa de velocidades é a manual de seis usada por muitos outros modelos do grupo. Uma transmissão com engrenagem rápida, suave e precisa. Apenas o pedal de embraiagem com curso longo obriga a alguma habituação para o arranque sair perfeito.

O motor 1.0 TSI, um três cilindros turbocomprimido de 999 cc, tem aqui 110 cv às 5500 rpm e um binário máximo de 200 Nm, às 2000 rpm. Está muito bem insonorizado no Golf, chegando pouco ruído ao habitáculo quando se circula em cidade.

A caixa de velocidades está bem escalonada, de modo que a elasticidade é mais que suficiente, mesmo abaixo da barreira das 2000 rpm. O peso de 1264 kg também ajuda. Um Polo 1.0 TSI só pesa mais 57 kg.
Agilidade em cidade
A agilidade em cidade é muito boa, é um prazer “trabalhar” com esta caixa e este motor. Sai tudo suave e despachado, não há soluços nem hesitações. A direção não tem excesso de assistência, nem lhe falta precisão, tal como pedal de travão. Tudo muito bem calibrado, muito bem equilibrado. A boa visibilidade para fora e o diâmetro de viragem curto facilitam as manobras.

A suspensão, que nesta versão usa barra de torção atrás, tem aquele tipo de conforto típico dos VW: nunca incomoda os ocupantes com pancadas secas, mas também não deixa a carroçaria bambolear após uma lomba. O condutor sabe sempre o estado em que está o piso, sem que isso seja maçador.

Os pneus Nexen Nfera Sport com medida 225/45 R17 fazem muito bem o seu papel, tanto em termos de aderência como de conforto. A Nexen é uma empresa Sul-Coreana, fundada em 1942, que sabe muito bem o que faz.
Consumo em cidade
Ainda sem qualquer tipo de sistema híbrido, este 1.0 TSI gastou 7,1 l/100 km em cidade, no meu habitual teste de consumos, sempre com o A/C desligado e circulando ao ritmo do trânsito. É um valor facilmente batido por um “full hybrid”.

Em nenhuma altura o Golf 1.0 TSI se sente minimamente sub-motorizado. Os 110 cv são mais do que suficientes para manter um ritmo de cruzeiro confortavelmente perto do limite de velocidade nas autoestradas nacionais. O motor continua muito bem isolado, há poucos ruídos aerodinâmicos e os pneus não se fazem ouvir em excesso.
Em autoestrada gasta pouco
A suspensão mostra boa tolerância face a pisos ondulados, mantendo uma boa estabilidade. Os sistemas eletrónicos de ajuda à condução não são excessivamente intrusivos, mas apetece sempre desligar a manutenção ativa de faixa de rodagem.

A sexta velocidade é um pouco longa, como seria de esperar para se conseguir reduzir consumos em autoestada. No meu teste de consumos em autoestrada obtive um valor de 5,6 l/100 km, bem melhor do que em cidade, como é lógico. Nestes terrenos, os híbridos já só acrescentam peso.
Motor surpreende
Passando a estradas secundárias com curvas de vários ângulos e usando mais os regimes altos, é claro que o som típico dos motores de três cilindros se faz ouvir. Mas é um som que até agrada ao ouvido. A sua vivacidade às 6500 rotações por mínuto surpreende pelo vigor com que passa força às rodas motrizes dianteiras. E nem precisa de modos de condução.

A verdade é que o 1.0 TSI parece ter mais do que os 110 cv anunciados. Percebe-se que prefere os regimes acima das 2000 rpm, abaixo tem um pequeno lapso de tempo até dar o máximo. Mas a caixa manual ajuda a evitar esses regimes, com reduções rápidas e que apreciam um bom ponta-tacão.
Os pneus voltam a mostrar que se dão bem com este chassis, muito bem controlado quando se aumenta o ritmo da condução, sem problemas de tração. Os amortecedores limitam bem a inclinação lateral e absorvem exemplarmente o mau piso.
Tudo bem calibrado
Claro que esta plataforma MQB tem elevada rigidez torcional, mesmo com cinco amplas portas. E isso deixa a suspensão dar o seu melhor. Nunca perde o contacto com o asfalto, mas não transmite desconforto ao condutor. Sente-se tudo, mas nada incomoda.

A VW anuncia uma aceleração 0-100 km/h de 10,2 segundos, um tempo adequado para uma motorização como esta, que atinge os 202 km/h de velocidade máxima, um dado relevante nos troços de autoestrada sem limite que ainda há na Alemanha.
Chega a divertir
A sensação de controlo e de fazer tudo bem incita a aumentar o ritmo da condução, descobrindo que a frente suporta bem entradas em curva mais exageradas, sem reverter para subviragem muito cedo.
E a suspensão traseira até aceita ser provocada na entrada, com uma travagem no ponto certo, deslizando o necessário para fazer rodar o Golf. Antes de o ESC entrar e fazer o seu trabalho sem estrondo.

A dinâmica é muito fluída e progressiva, a transição da subviragem para a sobreviragem ocorre sem sobressaltos e com grande sensação de controlo. Eu sei que são só 110 cv, mas o gozo que proporcionam, a velocidades que não são um escândalo, é admirável.
Claro que este Golf, como os outros, não é barato posicionando-se ao mesmo nível que um Toyota Corolla 1.8 Hybrid de 122 cv, que gasta menos em cidade, mas não proporciona o mesmo prazer de condução, seja a andar devagar ou mais depressa.
Conclusão
O primeiro Golf GTI tinha os mesmo 110 cv deste 1.0 TSI. Claro que os tempos passaram e a escalada de potência das versões desportivas multiplicou esse número várias vezes. Mas o Golf TSI tem tudo aquilo que aprecio num familiar compacto: espaço, conforto, performance suficiente, consumos aceitáveis e um bónus na forma de uma dinâmica que sabe divertir. Pena ter demorado tanto tempo a descobrir uma das melhores versões da oitava geração do Golf.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
VW Golf 1.0 TSI
Potência: 110 cv
Preço: 28 118 euros
Veredicto: 4 (0 a 5)
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