Depois do teste do Renault 5 E-Tech na “ville”, na “autoroute” e na “campagne” em França, chegou agora a altura de o testar nas estradas portuguesas. Neste Teste TARGA 67, conduzido por Francisco Mota e fotografado por João Apolinário, vai ficar a saber quais são as autonomias reais em cidade e na autoestrada.

Há sempre diferenças entre testar um novo modelo em estradas fora do país e nas nossas estradas. E não é porque os pisos nacionais são muito piores, como acontecia há décadas. O tipo de piso, muitas vezes ditado pelo clima local no Inverno, os traçados, que foram feitos por outros técnicos e o próprio conhecimento das estradas, são tudo fatores que fazem a diferença.

Já me aconteceu algumas vezes trazer certas impressões de detalhes de um teste feito noutro país e depois não as confirmar quando testo o mesmo modelo em estradas portuguesas. Claro que as condições de cada carro podem mudar, de coisas tão simples como a medida dos pneus, até razões mais profundas, como guiar primeiro um pré-série e depois a versão final. Ainda mais difícil é ficar com uma ideia dos consumos, sobretudo com modelos elétricos.
Teste em Portugal
O tempo e o tipo de estradas que os construtores propõem para um primeiro teste internacional, raramente incluem as condições necessárias para ficar com uma ideia correta de consumos e de autonomias, mais ainda no caso dos elétricos. Torna-se impossível comparar valores obtidos numa qualquer estrada europeia, com os que encontro nos meus percursos e velocidades médias fixas do Teste TARGA 67. Por isso, é muito importante testar em Portugal, nas condições que os potenciais compradores vão encontrar.




Ter um modelo à minha disposição durante vários dias em solo nacional também é muito diferente de fazer um teste de poucas horas em estradas desconhecidas. Por isso, a oportunidade de testar o vencedor do The Car Of The Year 2025 nas estradas que conheço era imperdível, apesar de, como jurado do prémio mais prestigiado da indústria automóvel, não ter sido o meu favorito na minha votação final.
Estilo nostálgico
O R5 E-Tech tem muitos argumentos a seu favor, desde logo o estilo nostálgico que funciona muito bem. Coisa rara se olharmos para outros exemplos deste tipo de desenho, com a exceção do Fiat 500, que foi o primeiro nostálgico a resistir bem ao passar dos anos, foi lançado em 2007 e ainda hoje agrada à vista. No caso do R5, o estilo funciona bem junto de quem tem idade para ter convivido com um dos R5 originais, mas também para quem nunca viu um. Pode dizer-se que é um carro com proporções modernas e detalhes nostálgicos, feito à escala atual, muito maior do que o R5 lançado nos anos 1970.



A plataforma AmpR Small é estreada aqui, mas vai ser usada noutros modelos, como o já desvendado R4 E-Tech. É uma de três novas plataformas feitas em exclusivo para modelos elétricos, tendo sido concebida pela Ampere, a divisão de elétricos do Group Renault. Trata-se de uma base com suspensão independente às quatro rodas, motor e tração à frente e bateria colocada sob o habitáculo. Os estilistas foram muito bem sucedidos em disfarçar a altura, resultado do posicionamento da bateria, pois as proporções de “hatcback” não foram minimamente afetadas.
Made in France
O comprimento é de apenas 3920 mm, cerca de 130 mm mais curto que um Clio e a distância entre-eixos é de 2540 mm, 40 mm mais curta que a do Clio, apesar de ser entre os eixos que está instalada a bateria de 52 kWh. É uma bateria NMC e pesa 300 kg, menos 20 kg que a do Zoe. A partir deste ano, as suas células vão passar a ser produzidas na nova Gigafactory da Ampere no Norte de França e não importadas da China. Esta bateria carrega a 100 kW DC, encontrando um desses carregadores rápidos, demora 30 minutos para ir dos 15% aos 80% de carga. Com tudo isto, a Renault conseguiu ainda assim manter o peso nos 1450 kg.



O motor síncrono bobinado é novo, com um rotor 30 mm mais curto que o motor do Megane, do qual deriva, sendo 15 kg mais leve. Tem uma nova eletrónica de potência e com todos os componentes integrados, pesa 105 kg. A versão deste Teste TARGA 67 é a mais potente da gama com 150 cv. Mas há uma versão de 120 cv e vai chegar mais tarde outra com 95 cv e bateria de 40 kWh prometida abaixo dos 25 000 euros.
Por dentro
A posição de condução é ligeiramente mais alta que a de um Clio, o volante é quase quadrado mas tem regulações suficientes e está bem posicionado face aos pedais e ao banco. Este é inspirado nos bancos do antigo R5 Turbo, com bons apoios laterais e confortável, sendo forrado a material reciclado. O mesmo material é usado nas portas e no tablier em frente ao passageiro, numa zona que faz lembrar o desenho do R5 original. Tudo o resto é feito de plásticos duros, alguns com um tato pouco simpático. Para aproveitar melhor o espaço na consola central, a alavanca da transmissão é uma terceira haste na coluna de direção, à direita. É fácil de usar mas não tem posição “P”, é preciso usar o travão de mão elétrico. O que tem é uma posição “B” de maior regeneração nas desacelerações.




O painel de instrumentos de 10,1” é muito fácil de ler, enquanto o monitor central tátil horizontal de 10”está razoavelmente organizado, com teclas físicas em rodapé para atalhos úteis, comandos por voz no sistema Google Auto embarcado e um avatar chamado Reno. O botão “engine start” está no tablier, ficando tapado pelo aro do volante e o eterno satélite do rádio da Renault, está escondido atrás do volante, tendo botões muito pequenos. O espaço na frente é razoável, mas a segunda fila tem pouco comprimento para pernas e pés. Além disso, o piso é alto e deixa as coxas mal apoiadas. A mala tem 326 litros, com um compartimento sob o piso para os cabos da bateria. Mas não há “frunk”.
Bom em cidade
Em andamento, a primeira sensação vem da exagerada assistência da direção, que lhe retira tato. Mas facilita as manobras, em conjunto com um razoável diâmetro de viragem de 10,3 metros. Os encostos de cabeça altos na segunda fila, dificultam a visibilidade para trás, tornando a câmara de marcha-atrás essencial. Os modos de condução, disponíveis num botão colocado no volante, são: Eco/Confort/Sport/Perso, com o primeiro a ser muito suave, mais até do que o Confort. O pedal de travão também está muito bem calibrado, sendo progressivo em todo o curso pois usa o sistema “OneBox” que não tem ligação mecânica entre o pedal e o sistema hidráulico de travagem, é tudo “by-wire”.



Surpreende o conforto proporcionado pela suspensão independente às quatro rodas, pelo amortecimento e pelos pneus 195/55 R18, medida comum a todas as versões. Tanto mais que isso é conseguido sem movimentos parasitas da carroçaria, nem inclinação lateral exagerada. Apenas com boa afinação dos amortecedores e dos casquilhos, que só os buracos mais fundos conseguem incomodar.
Consumos em cidade
O R5 não tem função “one pedal”, apenas o modo “B” que não é muito intenso, obrigando a usar sempre o travão para imobilizar o veículo. Patilhas para regular a regeneração em vários níveis trariam um maior envolvimento na condução, mas não estão previstas no R5 E-Tech. No Teste de Consumos Reais TARGA 67, com A/C desligado, modo “B” ligado e no modo Eco, em cidade, o R5 gastou 12,1 kWh/100 km, o que equivale a uma autonomia real de 430 km. Em autoestrada, a 120 km/h estabilizados e com o modo B desligado, gastou 18,7 kWh/100 km o que equivale a 280 km de autonomia. São valores que mostram a vocação citadina do R5.


Em autoestrada, o R5 é muito estável e controlado, mas não deixa de ter reações rápidas, quando é isso que se pretende, até porque a sensação de potência disponível é boa no modo Confort, que não está limitado aos 116 km/h como o Eco. Não se notam ruídos de rolamento, apenas alguns de origem aerodinâmica e um distante zunido do motor elétrico. As ajudas eletrónicas, pareceram-me razoavelmente calibradas.
Quase desportivo
A aceleração 0-100 km/h é anunciada em 8,0 segundos, um valor correto e que se mostrou totalmente credível, assim que encontrei uma reta desimpedida, passei ao modo Sport e arranquei com o pedal da direita a fundo. Muito boa tração, muito boa gestão de binário. E quando foi preciso travar forte, o pedal respondeu com um tato consistente e fácil de dosear.



Em estradas mais sinuosas, o volante tem um diâmetro um pouco grande, mas, em modo Sport, a direção fica menos leve, transmitindo bom “feedback” das rodas dianteiras. O R5 entra em curva com pouca inclinação lateral, a frente é precisa e rápida, evitando muito bem a subviragem. Depois, assenta numa atitude neutra em que se percebe a boa distribuição de esforços pelas quatro rodas, sobretudo em curvas longas de forte apoio.




Exagerando na velocidade de entrada em curva, aparece um pouco de subviragem, mas tem fácil remédio, bastando aliviar um pouco o acelerador. Em curvas lentas, o chassis aceita provocações logo na entrada, com uma desaceleração brusca a colocar a traseira a rodar em ângulos que quase não precisam de emenda e sem chamar o ESC. Esta agilidade não é vulgar nas versões “normais” de elétricos deste segmento, mais ainda por surgir de forma progressiva e previsível.
Conclusão
A versão deste Teste TARGA 67 é a Iconic, a mais equipada, que custa 35 000 euros. A versão Techno, abaixo, custa 33 000 euros. Não são preços baixos, mas os níveis de equipamento são bons e o R5 E-Tech não pretende ser um “low cost”, pelo contrário, os seus rivais são os modelos premium deste segmento. Não é uma ambição desmedida, tendo em conta aquilo que o R5 oferece em termos charme e experiência de condução.
Francisco Mota
Renault 5 E-Tech Electric Iconic
Potência: 150 cv
Preço: 35 000 euros
Veredicto: 4 estrelas
Ler tambem, seguindo o link: Teste – Renault 5 GT Turbo: Eram outros tempos…