Um Lexus sem motorização híbrida é uma raridade, na Europa. Mas, nos EUA, um descapotável com desenho de sonho, motor V8 atmosférico e tração atrás ainda faz todo o sentido. Aqui fica o teste do LC 500 Cabrio, para memória futura.
Um Lexus em teste costuma ser sinónimo de verificar consumos, analisar a eficiência e deslindar o sistema híbrido. Mas, desta vez é diferente. O LC500 cabrio não tem motor híbrido. Em vez da bateria, dos motores elétricos, da transmissão híbrida e daquele arranque silencioso, este LC500 tem um belo motor 5.0 V8 a gasolina.

Aqui está a Lexus, a marca líder nos híbridos premium, a mostrar que também sabe jogar o jogo dos “old school”. E não o fez de qualquer maneira. Não chegava um V6 turbo, tinha mesmo que ser um V8 atmosférico, o mais puro símbolo da exuberância mecânica.
Parece um “concept-car”
Sendo um Lexus, claro que não há lugar a estilo nostálgico, eufemismo para cópia de um carro antigo. Os Lexus olham sempre para o futuro, quer se goste ou não. As linhas do LC já não são novidade, o coupé foi apresentado em 2016 e este cabrio em 2019.

Tem ares de “concept-car”, com as suas linhas ousadas. É largo e baixo, faz lembrar um carro do Michel Vaillant. Para mim, o que mais me impressiona é a reduzida altura da frente, pouco mais alta do que as jantes de 21” calçadas com pneus de perfil 40.
Muitos perguntaram “que Lexus é este?” e isso diz tudo do sucesso do design do LC e da imagem da marca
O estilo cabrio talvez lhe dê um ar um pouco mais clássico, mas é mesmo só um pouco. Ninguém que o viu passar perguntou “que carro é este?” mas muitos perguntaram “que Lexus é este?” e isso diz tudo do sucesso do design do LC e da imagem da marca.
Luxo no interior
Depois de deixar os olhos estudar todos os ângulos da carroçaria, abrir a porta e entrar para o habitáculo é quase um anti-climax.
Claro que a qualidade dos materiais e da montagem é de primeiro plano, claro que o geral da ergonomia está correta. Mas o ambiente é muito mais tradicional: gera admiração, não gera espanto.

Dito isto, o interior forrado a couro dá o mote para a personalidade deste LC500 cabrio. O ênfase vai todo para o luxo, para uma certa ideia de bem-estar que é muito própria da Lexus e muito distante dos rivais alemães.
Ao volante
A posição de condução é baixa o suficiente, a coluna de direção tem o ângulo certo e o volante “cai” perfeitamente nas mãos. Há duas grandes patilhas metálicas para comandar a caixa automática de 10 velocidades e um painel de instrumentos digital, com um anel metálico que desliza para o lado.

O ecrã digital central tem um aspeto antiquado, o que mostra bem a velocidade da evolução destes componentes nos últimos anos. E ainda é comandado pelo “touchpad” que não se consegue usar bem com o carro em andamento e já está a ser abandonado pela marca.
Pouco espaço
O LC (Luxury Coupé) é um 2+2 mas os lugares de trás quase não têm espaço para as pernas. Num carro de 4,76 metros, seria de esperar melhor. Mas há razões para isso. Neste caso, a razão é a presença, entre os bancos e a mala, do compartimento para a recolha da capota.

É o mesmo espaço que é usado no coupé para a bateria da versão híbrida. Por isso o LC Cabrio não tem disponível a versão V6 híbrida, não há onde guardar a bateria, tanto mais que a capacidade da mala já é só de 197 litros.
O comando elétrico abre a capota em 15 segundos (fecha em 16s…) o que se pode fazer em andamento até aos 50 km/h
A capota é feita de quatro estratos, para garantir uma insonorização próxima à do coupé e tem comando elétrico que a abre em 15 segundos (fecha em 16s…) o que se pode fazer em andamento até aos 50 km/h.
Aquele som do V8
Muito bem sentado no banco envolvente a que nem falta aquecimento do pescoço, ligo o V8 e os ouvidos são presenteados pelo som compassado e grave típico dos motores com esta arquitetura. É verdade que nem tudo é… verdade.

Há um sintetizador que “reforça” o som através dos altifalantes do carro e um sistema que regula borboletas no escape. Mas está tudo tão bem feito que parece 100% genuíno.
Irresistível dar uma aceleradela e ouvir o V8 atmosférico a subir de regime. Se os V8 vão sendo raros, os V8 sem turbos ainda mais.
Este da Lexus sobe de regime com rapidez e extrema suavidade. Não é um V8 “bruto” à americana, apesar de os EUA serem o seu principal mercado. É um V8 feito como uma peça de relojoaria.
Modo… Suavidade
A caixa é muito suave no arranque e o LC500 surpreende pelo conforto da suspensão. As jantes de 21” não contaminam o trabalho dos amortecedores variáveis no modo de condução Comfort. Há também os modos Eco/Normal/Sport/Sport+/Custom.

Em mau piso, notam-se algumas vibrações estruturais, inevitáveis quando se “corta” o tejadilho a um carro deste tamanho. Mas os reforços estruturais aplicados no piso e em redor do habitáculo minoram a questão.
Medida americana
Em cidade, a largura de 1,92m, a posição de condução baixa e a grande inclinação do para-brisas não ajudam nas manobras, nem nas ruas mais estreitas. Se a capota for fechada, claro que tudo se torna ainda mais difícil. Mas a direção às rodas de trás dá uma ajuda.

O LC500 cabrio foi feito pela medida americana e isso não se nota apenas nas dimensões, o consumo que registei no meu habitual teste de cidade, com A/C desligado, não baixou dos 14,2 l/100 km. Sempre a andar dentro da lei.
Contudo, na “highway”, o V8 gasta muito menos, como pude comprovar a rolar tranquilamente a 120 km/h. Assim, o computador de bordo ficou-se por uns muito mais aceitáveis 7,3 l/100 km.
Capota excelente
Aproveitei a autoestrada para testar a capota. Fechada, isola muito bem do ruído, que no LC500 já é muito reduzido, seja o originário dos pneus a rolar, seja da aerodinâmica.

Abrindo a capota, mas mantendo os vidros para cima e contando com um defletor de policarbonato entre os encostos de cabeça traseiros, os turbilhões permanecem fora do habitáculo até aos 120 km/h.
Mas a melhor maneira de usufruir do LC500 cabrio, logicamente não é na autoestrada. Impunha-se escolher uma boa estrada para um “passeio” ao som do ronronar do V8.
Embalado pelo V8
O motor é muito suave a baixas rotações e não tem a explosão de binário típica dos turbocomprimidos. Chega aos 530 Nm apenas às 4800 rpm. Pede para ser usado de outra forma, “puxando” mais pelas rotações, usando as mais altas, o que para o V8 é um prazer que dura até às 7500 rpm.

A caixa automática é aqui uma boa aliada, respondendo com rapidez e obediência a sucessivas reduções. O V8 tem um trabalhar equilibrado e progressivo à medida que sobe o regime, por volta das 4500 rpm ganha um novo ímpeto e dá o seu melhor para lá das 7000 rpm, o que torna a sua utilização quase viciante.
Pesado, mas rápido
Mais ainda, usando os modos Sport ou Sport+, nos quais o som sobe a um volume e tonalidade que faz vibrar (literalmente…) qualquer condutor que goste de motores desportivos.
São 477 cv disponíveis às 7100 rpm, o que chega para fazer os 0-100 km/h em 5,0 segundos. Só não faz melhor porque o peso ascende aos 2035 kg, mais 105 kg que o coupé.
Em estradas com traçado fluído, sem curvas lentas, o LC500 cabrio é um prazer de guiar. Mais devagar ou mais depressa, com a capota para baixo, embalado pelo som do V8 e pelo excelente conforto.
E nas estradas difíceis?
Mas a curiosidade de saber como seria a dinâmica em estradas mais exigentes, levou-me inevitavelmente para outros terrenos, mais sinuosos, com asfalto menos perfeito e curvas menos previsíveis.

Neste cenário, o LC500 Cabrio mostrou que o tamanho e o peso não castigam tanto a dinâmica como se poderia supor. A frente sente-se ligeira e rápida a reagir, resultado do posicionamento recuado do motor que dá uma distribuição de pesos quase de 50:50.
Mesmo se a direção não é tremendamente rápida, a direção às quatro rodas compensa muito bem, sentindo-se o efeito, sem se sentir o processo.
Sobrevirador? Que surpresa!
Mas a surpresa vem depois. Em aceleração sustentada ao longo da curva, a tendência inicial é a sobreviragem ligeira. A traseira tende a deslizar um pouco, ajudando a rodar o carro ao longo da curva.

É uma atitude inesperada, tendo em conta o acerto confortável da suspensão, mesmo em modo Sport+. Mas é algo que não se impõe ao condutor, está lá para quem for à procura dela.
Claro que o ESC controla sempre a situação na altura certa, mas desligando-o completamente, podemos usufruir em pleno da tração traseira e do diferencial Torsen. Uma deriva de maior ângulo está à distância de uma aceleração mais decidida.
Melhor no bom piso
Em geral, a correção é fácil de aplicar, o carro dá tempo para isso. Mas em pisos em pior estado, devido à menor rigidez da estrutura, o ponto em que a traseira começa a deslizar pode não ser fácil de antecipar.
Para um europeu, um carro como este sabe hoje a despedida, já com uma lágrima de saudade
Curiosamente, conclui que, querendo gozar as delícias das derivas de potência, é melhor provocar mais do que menos, pois as reações acabam por ser mais lineares, quando se quebra francamente a aderência do eixo traseiro.
Conclusão
Para um europeu, um carro como este sabe hoje a despedida, já com uma lágrima de saudade. Com toda a pressão da eletrificação que se sente na Europa, pode mesmo parecer já uma máquina do passado. Mas nos EUA a transição energética não corre à mesma velocidade e, para muitos, um LC500 cabrio com o seu V8 5.0 ainda faz todo o sentido.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
Lexus LC500 Cabrio F Sport+
Potência: 477 cv
Preço: 189 000€
Veredicto: 4 (0 a 5)
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