Para o seu segundo elétrico no mercado Europeu, a Honda não podia deixar de escolher o segmento B-SUV, o de maior crescimento na região. O que vale este enigmático e:NY1 é o mote para mais um Teste TARGA 67, conduzido por Francisco Mota e fotografado por João Apolinário.
Os japoneses não fazem nada que não tenha uma explicação, mesmo que a lógica só seja óbvia para alguns. É o que se passa com o estranho nome deste B-SUV elétrico da Honda, feito com base na mais recente geração do HR-V, lançada em 2021 com motorização híbrida.
Em vez de HR-V EV, ou HR-V Electric (que já não era fácil) a marca fundada em 1948 preferiu a enigmática designação e:NY1 e avança uma explicação. O “e” porque é um elétrico; “NY” quer dizer “new you” e o “1” porque se trata do primeiro elétrico da nova geração. Eu pensava que o primeiro tinha sido o citadino Honda E… Mas há quem diga que, lido tudo de uma vez, o nome pode significar “anyone”, aludindo à expansão dos elétricos.

São demasiadas explicações para um B-SUV elétrico de 4,387 metros de comprimento, com 2,607 metros de distância entre-eixos, praticamente as mesmas cotas do líder do segmento B-SUV elétrico em Portugal, o Peugeot E-2008.
Derivado do HR-V
As diferenças de estilo para a versão híbrida são poucas e ficam-se pela frente sem grelha, com a porta para as tomadas de carregamento, e pelo desenho dos para-choques, bem como das jantes, que no e:NY1 são de 18” com pneus 225/50 R18. O símbolo da marca foi substituído pelo nome escrito por extenso sob a faixa que une as luzes de trás.
O perfil alude levemente a um “fastback” com bastante inclinação do vidro traseiro, que leva um spoiler proeminente no topo e pelos puxadores das portas de trás dissimulados na área vidrada. A altura ao solo parece maior do que é (135 mm) devido ao tamanho das rodas e ao desenho da parte inferior da carroçaria.

A mala tem uma capacidade de 361 litros e acesso correto, mas é relativamente estreita. Tem um espaço sob o piso para guardar os cabos da bateria, pois não existe um compartimento sob o capót dianteiro.
Por dentro
Na segunda fila da bancos falta largura. Há bastante comprimento para as pernas, a altura e o acesso são razoáveis, mas a largura é insuficiente para levar três adultos. O piso é alto e obriga as pernas a irem mal apoiadas.

Nos lugares da frente, logicamente que a questão da largura não se coloca, até porque a consola não ocupa muito espaço. Os bancos são confortáveis o suficiente e têm algum suporte lateral. A posição de condução é alta, para o segmento, o que proporciona boa visibilidade para a frente e para os lados. O vidro baixo atrás obriga a prestar atenção à câmara de marcha-atrás nas manobras.
Ecrã gigante
O volante tem boa pega, mas a amplitude do ajuste em alcance é insuficiente, o que obriga a levar as pernas demasiado fletidas. O painel de instrumentos digital não tem informação a mais e a sua definição é muito boa, como é hábito na Honda, facilitando a leitura. Mas o computador de bordo é pouco intuitivo.

O ecrã tátil central é muito maior do que na versão híbrida do HR-V, com 15,1” de diagonal e disposto na vertical, ocupando uma grande área. Não sobra espaço para muitos botões físicos. A regulação da climatização é feita no monitor, o que obriga a desviar os olhos da estrada. Mas, pelo menos, os respetivos comandos estão permanentemente visíveis no terço inferior do ecrã.
Mais críticas para o terço do meio, onde se encontram os menus pouco intuitivos para as outras funções do infotainement, deixando a parte superior para a navegação. Críticas também para os comandos da transmissão, os botões P, R, N e D que estão separados em botões individuais, nem todos de atuação igual, o que os torna confusos em manobras.

Quanto à perceção de qualidade dos interiores, o que se nota é uma falta de homogeneidade. A maioria dos plásticos são duros, mas também há zonas forradas a pele sintética com reprodução de pespontos. Nada de muito impressionante. Em termos de utilização, faltam mais porta-objetos.
O sistema elétrico
O sistema elétrico deste e:NY1 utiliza um motor elétrico dianteiro com tração às rodas da frente. Tem 204 cv e 310 Nm, sendo alimentado por uma bateria de 68,8 kWh brutos (61,9 kWh úteis) colocada sob o habitáculo. Isto faz o peso atingir os 1730 kg, cerca de mais 350 kg que a versão híbrida do HR-V.
A Honda anuncia uma autonomia WLTP em ciclo misto de 412 km. Uma carga completa a 11 kW AC demora 6h00, enquanto que para ir dos 0 aos 80% a 78 kW DC, demora 45 minutos.

Há três modos de condução: Eco/Normal/Sport. Para o teste em cidade, comecei pelo primeiro que mostrou um doseamento fácil e suave do acelerador, com boas prestações. As patilhas no volante servem para escolher entre quatro níveis de intensidade na regeneração durante a desaceleração, mas não há função “one pedal”.
Os níveis são muito próximos e pouco intensos e também não há um nível zero, para deixar o carro deslizar, puxado apenas pela inércia. Felizmente, o pedal de travão não é difícil de dosear.
Consumo baixo em cidade
A direção tem um diâmetro de viragem de 11,6 metros, o que não é brilhante e a assistência pareceu-me exagerada, ficando muito leve e com pouco tato, mesmo em cidade. Muito boa insonorização em meio urbano e a dupla suspensão/pneus consegue um nível de conforto aceitável, mesmo em pisos imperfeitos.

No habitual Teste TARGA 67 de consumos reais, obtive um valor de 12,6 kWh/100 km, em percurso urbano, sempre com o A/C desligado, em modo Eco e usando as patilhas da forma que me pareceu a mais lógica. Isto equivale a uma autonomia real em cidade de 491 km.
Em autoestrada, com a regeneração no mínimo, ainda em modo Eco, A/C desligado e a uma velocidade estabilizada de 120 km/h, o valor que registei foi de 21,4 kWh/100 km, o que equivale a uma autonomia real em autoestrada de 290 km. Ou seja, bons consumos em cidade e consumos normais em autoestrada.
Dinâmica pouco entusiasmante
Em vias rápidas ou autoestradas, a suspensão deixa a carroçaria oscilar um pouco em excesso. É verdade que continua confortável, mas podia ter um pouco mais de controlo, até porque assim fica sensível aos ventos laterais. A insonorização continua muito boa.

Antes de terminar o Teste TARGA 67, uma passagem por uma estrada secundária, agora em modo de condução Sport, que aumenta bastante a rapidez de resposta do acelerador e diminui a assistência da direção. Os amortecedores não são adaptativos. A Honda anuncia uma aceleração 0-100 km/h de 7,6 segundos, o que pareceu perfeitamente credível. A velocidade máxima é de 160 km/h.
Boa aceleração, quando se carrega no pedal da direita a fundo, mas não propriamente impressionante, para um elétrico dos nossos dias. A travagem, com quatro travões de disco, revelou-se suficiente e o uso das patilhas de regeneração faz algum efeito.
Binário mal modulado
Infelizmente, a modulação dos 310 Nm de binário máximo não está perfeita, deixando as rodas motrizes dianteiras perder tração e patinar assim que se acelera com mais intenção. Isso acontece não só na reaceleração para sair de uma curva lenta, mas até em reta se a aderência não for perfeita.

As perdas de tração, em condução rápida são apenas um dos sinais que o e:NY1 dá ao condutor para baixar o ritmo da condução. A inclinação da carroçaria em curva e as oscilações nos encadeados, são outros. O e:NY1 pode ser fabricado pela marca que produz o Civic Type R, mas o comprador alvo é totalmente diferente.
Exagerando um pouco com a velocidade de entrada em curva, a subviragem instala-se rapidamente e obriga o ESC a arregaçar as mangas e resolver a questão.
Conclusão
Não sei como um departamento de marketing pode aprovar um nome como e:NY1, mas essa é a menor das preocupações que a Honda deve ter com o seu segundo elétrico na Europa. É certo que o espaço, o conforto e a insonorização são pontos fortes, tal como a autonomia em cidade. Mas a qualidade apercebida, a dinâmica extra-urbana e sobretudo o preço, retiram competitividade a este B-SUV elétrico.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
Honda e:NY1
Potência: 204 cv
Preço: 54 750 euros
Veredicto: 3 estrelas
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