Guiar um novo M3 é sempre especial. Mas confesso não estar à espera do que me reservava a geração G80. Se a grelha é discutível, o que posso dizer é que tudo o resto é… indiscutível!
Em 1986, a BMW lança no mercado o primeiro M3, com base na segunda geração da Série 3, com o código interno E30. O plano era produzir 5000 unidades, obrigatórias para ser homologado em competição, no Grupo A. E depois inscrever o carro no ultra-popular DTM, o campeonato alemão de carros de turismo.
Mas o modelo foi tão bem aceite que a BMW fabricou 18 000 unidades e aqui começa uma história de sucesso. Todas as gerações do Série 3 que se seguiram, tiveram o seu M3 e já vamos na sexta, a contar com a nova G80.

No total, o M3 foi produzido em mais de 280 mil unidades, um número impressionante, tendo em conta que nunca foi propriamente barato.
Era um 2.3 de quatro cilindros…
Começou com um motor 2.3 de quatro cilindros e 200 cv. Podia parecer pequeno, mas era um motor quase de competição. Depois passou para os seis cilindros em linha, chegou a ter uma geração com motor V8 e voltou aos seis em linha, agora sobrealimentado.
Ainda não foi desta que passou a ser um PHEV (felizmente!…) em vez disso tem um novo seis cilindros em linha de 3.0 litros, com injeção direta e dois turbos: um para os cilindros 1, 2 e 3 e outro para os cilindros 4, 5 e 6.

Nesta versão M3 Competition, debita uns estrondosos 510 cv às 6250 rpm, mas faz mais de 7000 rpm. Para comparação, o M3 anterior (F80) tinha um motor com a mesma arquitetura mas debitava 431 cv, subindo aos 450 cv, na versão Competition. Há uma versão M3 do novo modelo com “apenas” 480 cv e caixa manual.
Tudo faz sentido
O M3 Competition tem uma caixa automática de conversor de binário, com bloqueio para evitar o deslizamento, abandonando a caixa de dupla embraiagem do F80, mas mantendo duas fabulosas patilhas no volante. O diferencial autoblocante é de comando eletrónico.
Face ao modelo anterior, o G80, “cresceu” alguns milímetros em todas as direções, como todos os Série 3. Mas são as diferenças para as versões “normais” que mais impressionam, a começar pela largura 75 mm maior.

Os alargamentos dos guarda-lamas estão lá porque as jantes forjadas, com pneus Pirelli PZero Corsa 275/35 R19, na frente e 285/30 R20, atrás, precisam deles.
A função “intercooler” também precisa das entradas de ar centrais do para-choques; e os travões com maxilas de seis êmbolos, na frente, precisam das entradas nos extremos. Há discos carbo-cerâmicos em opção.
A 290 km/h só na “autobahn”
Tudo tem uma razão de ser, até a asa na tampa da mala, para reduzir o “lift” quando o M3 Competition for lançado a 250 km/h nas “autobahn” ou a 290 km/h, comprando o opcional M Drivers Package.

O tejadilho em fibra de carbono serve para descer o Centro de Gravidade e… falta falar da grelha! A BMW diz que foi inspirada nas grelhas dos anos sessenta, eu acho que foi mal inspirada. Mas isso pouco importa.
Engenharia ainda manda no M3
É difícil parar de elencar os detalhes técnicos do M3 Competition, por serem tantos e tão interessantes, para quem gosta de engenharia e de automóveis.
Por exemplo, o sub-chassis dianteiro é feito em alumínio só para o M3, tal como o de trás, que é rigidamente fixo à estrutura, não há borracha pelo meio.

A suspensão da frente tem braços específicos e os ângulos são todos diferentes dos Série 3 comuns. Os amortecedores ajustáveis são novos, com válvulas magnéticas e a direção tem cremalheira de passo variável.
Para garantir o máximo de rigidez estrutural, a BMW colocou uma barra anti-aproximação nas torres da suspensão da frente e reforços no piso e no fundo da mala.
Habitáculo… extrovertido
Se, por fora, o M3 Competition deixa toda a gente de boca aberta, os privilegiados que puderem aceder ao habitáculo não vão ficar menos impressionados. E não falo apenas da cor escolhida para o interior desta unidade destinada aos testes da Imprensa.
Falo dos bancos M Bucket, com parte da estrutura em carbono para serem 9,6 kg mais leves e proporcionarem uma posição de condução mais baixa. As costas têm duas zonas abertas, para arejar o tronco, parte do encosto de cabeça pode retirar-se, para quando se usa o carro em pista, com capacete.

Além disso, o apoio lateral é excelente, sobretudo nas pernas. Mas dificulta seriamente a entrada e saída. É preciso alguma ginástica, para o ultrapassar todos os dias.
Posição perfeita ao volante
O volante tem o diâmetro certo, está muito bem colocado, evita a moda da base plana e só a sua secção podia ser um pouco menos grossa, uma queixa que tenho de todos os “M”.
A alavanca da caixa automática é um pouco desconcertante nas manobras, devido à organização das posições PRND, mas este nem é o principal problema ergonómico.

Mantendo a mesma consola de botões das outras versões, a BMW teve que “inventar” para colocar os botões necessários no M3, nomeadamente o da escolha dos modos de condução (Set Up), o M Mode para regular as assistências à condução (Road/Sport/Track), além do botão que regula a rapidez da caixa em três níveis, “escondido” na alavanca.
Ainda mais botões…
Isto para já não falar do botão para os três modos do ESC (on/MDM/off), som do escape, câmaras de vídeo, ajuda ao estacionamento e “auto hold”. São muitos botões em pouco espaço, ao lado da alavanca da caixa.

Como é hábito, há dois botões no volante, M1 e M2, que se podem configurar com o botão “set up” e o ecrã tátil, onde se pode regular o acelerador, suspensão, direção, tato dos travões e o controlo de tração. Ou seja, pode configurar-se um botão para “máximo ataque” e outro mais confortável, para cidade.
Analisador de “drift”!?
Só mais dois detalhes, antes de passar às coisas sérias. O tato dos travões pode regular-se em dois níveis, mais progressivo ou mais agressivo, porque o servo-freio foi substituído por um sistema elétrico.
Segundo detalhe, que não é detalhe. O controlo de tração pode regular-se em 10 níveis, para quê? Para o condutor ter uma ajuda quando decide ir para uma pista fazer “drift”.

Há até um “analisador de drift” no infotainment que dá informações sobre os drifts que vão sendo feitos: comprimento, duração, ângulo e no final classifica o “exercício” de 1 a 5 estrelas. Tal como num jogo de vídeo, só que, no fim, há uma conta de pneus para pagar.
Momentos que não se esquecem
Como é que tudo isto se conjuga no M3 Competition era a minha missão, quando liguei o motor e ouvi o escape a gritar na garagem. Para quem tem a paixão dos automóveis, garanto que este é um momento que não se esquece.

E o que se segue, também não. Em modo Comfort, a caixa é geralmente suave e progressiva, mas por algumas vezes mostrou indecisão. O motor é muito disponível, sem tempo de resposta dos turbos e o pedal de travão não é repentino.
Mas sente-se logo que este M3 é uma “coisa séria” pelo pisar firme, resultado dos pneus de baixo perfil, suspensão dura e bancos ainda mais duros. Não se aprecia, mas suporta-se, porque a cabeça está sempre a pensar noutra estrada e noutra condução.
Nem gasta muito…
No meu teste em cidade, o consumo foi de 11,5 l/100 km, nada mau, tendo em conta que a única ajuda que o motor tem é o stop/start. Em autoestrada, gastou 7,8 l/100 km, rolando a 120 km/h, altura em que o botão para colocar o escape a fazer o mínimo de ruído acabou por saber bem.
Mas o que me interessava era a estrada de montanha, para testar o máximo de possibilidades de “afinação” que o M3 Competition proporciona. Modo Sport, ESC no nível intermédio e caixa em manual, para aquecer.
Motor é fa-bu-lo-so!
Na primeira reta desimpedida acelero a fundo. O seis em linha biturbo reage desde o primeiro milímetro do acelerador, atira o carro para diante e obriga os músculos da nuca a trabalhar.
A maneira como sobe até ao “red-line” é esmagadora. A não ser pelos 650 Nm de binário, quase podia jurar que não há um turbo debaixo do capót, muito menos dois.

A chegada do conta-rotações ao fim da escala é particularmente heróica, com o motor a gerar força, numa altura em que já esperava que começasse a escorregar no gráfico de potência. São 3,9 segundos para ir dos 0 aos 100 km/h e isso diz tudo.
Auto melhor que DCT? Claro!
Mas se o motor impressiona, a caixa não lhe fica atrás. No nível três, a rapidez das passagens a subir parece demorar tanto quanto o breve toque na patilha da direita. A descer, obedece a todas as ordens, fazendo “ponta-tacão” cada vez mais sonoro. Saudades da DCT? Nem pensar! Curiosidade da caixa manual? Nem por isso.

Mas, uma coisa é a performance em linha, outra é o comportamento em curva. Subindo ao modo Sport+, concluo que a única coisa que não me agrada é a assistência da direção que a faz pesada. Uma boa oportunidade para programar um dos botões M do volante.
Aproveito e desço o amortecimento para o nível intermédio, pois a estrada que estou a usar não é perfeita. Aumento o ritmo e peço tudo o que os travões têm para dar na próxima curva lenta. A resposta do pedal é incisiva e inspira confiança.
Grande aderência da frente
Rodo o volante com alguma urgência, mas percebo que estou em boas mãos. Os pneus 275 dianteiros têm imensa aderência, a direção tem a desmultiplicação e a rapidez de que preciso e o tradicional equilíbrio de pesos 50/50 da BMW faz o resto. Subviragem? Nenhuma.
A partir daí, é passar ao acelerador e deitar um olhar às “shift lights” para acertar com o regime certo para dar mais uma “patilhada”. A tração é excelente, as rodas traseiras põem a potência no chão sem hesitações, tirando o M3 da curva e disparando para a próxima reta.
Controlo de tração tem 10 níveis
A regulação do controlo de tração em 10 níveis seria algo a testar em 10 passagens na mesma curva, o que iria destruir os pneus. Abdico desse método científico e ponho-o em “off”.

A resistência da frente à subviragem dá confiança para aumentar a velocidade de entrada, mantendo depois o máximo de embalo e deixar o M3 rodar.
A verdade é que a inclinação lateral é tão pouca que a inércia nunca chega a ser uma ameaça. O M3 mantém um postura estável, mesmo em curvas rápidas e muito rápidas.
A andar depressa, o amortecimento ganha consistência e o M3 já não parece firme. Processa o piso e segue em frente, sem perder controlo nem saltitar de bossa em bossa.
Powerslides? Sim…
Querendo um registo mais extrovertido, antecipando a aceleração para o meio da curva, é claro que a traseira desliza. E desliza tanto mais quanto mais se acelerar. Mas nunca de maneira repentina ou inesperada. Agora, uma coisa é certa, os 510 cv obrigam a dosear com atenção o pedal da direita.

Mas, melhor do que analisar cada curva, caso a caso, é mesmo escolher um percurso e apreciar a consistência com que o M3 o trabalha, a agilidade que demonstra, apesar dos 1805 kg.
A elevada rigidez da estrutura dá uma base de trabalho fabulosa, tanto à suspensão como à tração. Os quilómetros passam depressa, a concentração é alta mas a satisfação ainda mais.
Muitas opções
A caixa rápida e o binário elevado dão a opção entre fazer uma curva com uma mudança acima ou abaixo, com eficiência semelhante. O M3 oferece sempre uma solução.
Aquilo que mais me agradava no anterior M3 era a maneira igualmente eficiente como lidava com um estilo de condução “certinho” e rápido ou com um estilo mais malabarista.

Neste novo M3 Competition, essa atitude mantém-se, só que tudo se passa a um nível superior, porque o novo motor é uma evolução notável.
Conclusão
O conceito do M3 evoluiu muito ao longo dos anos. De coupé desportivo, leve e ágil, passou a berlina com muita potência, alta qualidade e imenso equipamento opcional. Contudo, a verdade é que este M3 Competition propõe níveis de performance e de envolvimento na condução com que poucos desportivos de raiz podem sonhar. Para mim, é um 5 estrelas.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
BMW M3 Competition
Potência: 510 cv
Preço: 118 800 euros
Veredicto: 5 (0 a 5)
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