“Salvar a Alfa Romeo” tem sido uma responsabilidade atribuída a vários modelos da casa Italiana nas últimas décadas. Mas o Tonale tem hipóteses de sucesso como nenhum outro: nasce dentro do grupo Stellantis e tem a fisionomia da moda, é um SUV. Teste à versão 1.5 MHEV de 130 cv, para ver se é desta…
A história da Alfa Romeo está tão recheada de feitos notáveis, sobretudo ligados à competição automóvel de alto nível – com títulos na F1 e Le Mans – como de períodos de dificuldades industriais e financeiras que a levaram muito perto do abismo, por várias vezes.
A entrada no super-grupo Stellantis terá sido o maior seguro de vida de sempre, para a Alfa Romeo. Pode ser que venha a perder alguma coisa em termos de identidade, mas ganhou segurança, deixou de ter a corda na garganta.

A estratégia já começou a mostrar que o futuro imediato vai no sentido certo, com o lançamento do SUV médio Tonale. Sendo certo que o projeto vinha da era pré-Stellantis e que sofreu atrasos com a pandemia.
Tonale está na rua
Mas o Tonale está na rua e o que me interessa agora é perceber aquilo que vale. Para já, começo com a versão 1.5 MHEV de 130 cv, a mais acessível da gama, vendida por 40 600 euros, na versão de lançamento Edizione Speciale.
Olhar para um carro estacionado numa rua conhecida e com as chaves no bolso, suscita uma abordagem bem diferente de o ver num palanque de um salão, ou mesmo frente a um hotel de luxo, numa apresentação internacional.

E o que posso dizer é que, na vida real, as linhas do Tonale geram curiosidade e aprovação de quem o vê. Não são precisas muitas explicações. A estética junta proporções convencionais de um SUV semi-desportivo, com uma interpretação moderna dos principais ícones da marca.
Os ícones estão lá todos
Lá está a grelha de triângulo invertido e a matrícula descentrada. As luzes da frente com três elementos, agora em LED, as jantes com círculos de grandes dimensões e as luzes de trás, também com elementos em LED e unidas por uma faixa transversal.

O vidro traseiro, mais inclinado que noutros SUV, dá-lhe algo de quase-coupé e apenas a generosa altura de 1601 mm poderá parecer um pouco exagerada para um Alfa Romeo, além de o atirar para a Classe 2 das portagens de auto-estrada, se não tiver Via Verde. Mas há uma razão forte para isso.
Plataforma do Jeep Compass
O Tonale é feito sobre a mesma plataforma do Jeep Compass, por isso a margem de manobra em termos dimensionais e de peso (1600 kg, nesta versão) não era muito grande. A diferenciação teve que ser feita ao nível dos painéis exteriores da carroçaria e do ambiente interior.

Isso foi bem conseguido, com um habitáculo onde se podem encontrar materiais de boa qualidade, com alguns detalhes decorativos que lhe dão aquele ambiente típico da Alfa Romeo. É um esforço que se aplaude, e que legitima as pretensões de posicionamento premium do Tonale.
Lá no alto
A posição de condução é alta, para o segmento C-SUV, beneficiando a visibilidade. O banco é confortável, tem bons apoios laterais e ajustes suficientes. A coluna de direção também não está demasiado inclinada, permitindo uma boa localização e ajustes amplos do volante.

A caixa de velocidades é uma unidade de dupla embraiagem e sete relações, com uma alavanca convencional na consola, que facilita as manobras face à nova moda dos “interruptores”. E ainda há duas enormes patilhas metálicas fixas à coluna, que os dedos acham irresistíveis.

Nos lugares da frente, o Tonale sente-se largo mas não demasiado alto. Na segunda fila, há espaço mais que suficiente para dois adultos e mesmo o eventual passageiro do meio vai conseguir suportar curtas viagens. A mala tem 500 litros, um Audi Q3 tem 530 litros.
Mais que um “mild hybrid”
O painel de instrumentos é digital mas o seu contorno lembra os painéis usados nos Alfa Romeo do passado e faz animações de início e fim de sessão. O ecrã tátil central não é grande mas é relativamente fácil de usar.

O motor 1.5 turbo de quatro cilindros tem sistema “mild hybrid” que inclui o habitual motor/gerador no lugar do alternador e acrescenta um segundo motor elétrico de 20 cv e 135 Nm integrado na caixa de velocidades de dupla embraiagem.
Fica assim um degrau acima dos sistemas MHEV vulgares. Isso permite-lhe circular em modo 100% elétrico durante algumas centenas de metros, o que os MHEV “normais” não conseguem.

Mas só se a bateria estiver carregada, se se acelerar com muita suavidade e se for abaixo dos 30 km/h. São muitos “ses” mas num estacionamento de supermercado ou no “para-arranca” muito lento, funciona.
Regeneração rápida
Apesar de a bateria ter apenas 0,8 kWh de capacidade, e estar entre os bancos da frente para não roubar capacidade à mala, a regeneração é muito rápida.
É comum ter a bateria acima dos 50%, porque o motor/gerador também a carrega em aceleração, para ter sempre a performance máxima disponível.

O sistema dá uma ajuda nas recuperações. E nem é preciso estar sempre a olhar para o indicador dos fluxos de energia para perceber o contributo elétrico, que se reflete também nos consumos.
Consumos controlados
Isso mesmo pude comprovar no meu habitual teste de consumos em cidade que indicou um bom valor de 6,3 l/100 km. A insonorização está bem feita e a condução em cidade é suave, excepto a frio, altura em que a caixa mostrou algumas hesitações e soluços.

A Alfa Romeo trabalhou bastante na afinação da suspensão e mesmo no aumento de rigidez da plataforma do Jeep Compass e os resultados aparecem logo quando se circula em maus pisos.
Mesmo com jantes de 20” e pneus 235/40 R20 o conforto não foi demasiado prejudicado. O Tonale não “salta” sobre as tampas de esgoto desniveladas ou nos buracos e também não tem aquelas oscilações longitudinais típicas dos SUV mais altos, sobre bossas. A suspensão traseira independente tem aqui os seus méritos.
Direção muito leve
Em cidade, a direção pareceu-me muito leve e demasiado direta, ao ponto de ficar um pouco nervosa. Mas é uma “escola” da marca, comum com o Giulia e Stelvio. Há quem goste…

O diâmetro de viragem grande (11,5 metros) não ajuda nas manobras mas a câmara de marcha-atrás resolve a maioria das situações.
Passando à autoestrada, o Tonale mantém uma postura muito bem controlada e livre de oscilações parasitas. Sente-se “agarrado” ao chão, apesar de também se perceber que o Centro de Gravidade não é propriamente baixo.

Rolando a 120 km/h constantes, o consumo subiu aos 7,3 l/100 km, pois neste tipo de condução, o sistema “mild hybrid” tem menos oportunidades de participar.
E a dinâmica?…
Mas a parte deste teste que me gerava mais curiosidade era mesmo a condução rápida em estradas secundárias sem trânsito. E passando ao modo Dymanic no enorme comando rotativo da consola, que tem também os modos A e N, com diferenças notórias na resposta do acelerador.

A primeira impressão vem novamente da direção, muito direta mas que coloca a frente em curva sem subviragem, com os pneus Pirelli PZero a fornecer excesso de aderência.
A carroçaria tem pouca inclinação lateral em curva, a suspensão mantém tudo sob rigoroso controlo, numa atitude que resulta neutra. Os 130 cv desta versão surgem de forma progressiva, com uma ligeira preferência para a vizinhança das 5000 rpm. Os 240 Nm estão lá desde as 1500 rpm.
Mais chassis que motor
Mas a verdade é que o motor não entusiasma e as patilhas acabam por não dar ordem a passagens de caixa muito rápidas, por vezes é msmo preferível deixar o modo automático tratar das mudanças.

O som do motor podia ser mais melodioso, tratando-se de um Alfa Romeo, mas pelo menos não é falso. A aceleração 0-100 km/h está anunciada em 10,0 segundos.
Conclusão
A Alfa Romeo fez um bom trabalho, dado o ponto de partida que tinha no início do projeto. Esta versão de 130 cv que testei deverá ser claramente suplantada pela de 160 cv, que utiliza o mesmo “hardware” e que deverá ser a versão a comprar, pois a diferença de preço é de apenas 2000 euros. Num próximo teste, espero dar resposta a essa questão.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
Alfa Romeo 1.5 MHEV Edizione Speciale
Potência: 130 cv
Preço: 40 600 euros
Veredicto: 3,5 (0 a 5)
Ler também, seguindo o Link:
Primeiro teste – Alfa Romeo Tonale: Um SUV para “salvar” a marca