Desde 1941 que todos os Jeep têm uma versão 4×4, o pequeno B-SUV Avenger era o único a fugir à norma. Mas a questão foi resolvida com a nova versão 4Xe. Um sistema de propulsão “mild hybrid”, para as rodas da frente e um motor elétrico, para as de trás será suficiente para honrar a tradição? Respostas no Primeiro Teste TARGA 67, conduzido, em asfalto e em terra por Francisco Mota.

O Avenger é um caso especial entre os modelos da Jeep, por várias razões. Foi o primeiro modelo da marca americana a ser desenhado autonomamente pelo gabinete de estilo europeu da marca. Foi também o primeiro a ser projetado especificamente para os mercados Europeus e o primeiro a usar a plataforma CMP, partilhada com inúmeros modelos das marcas da Stellantis, da qual a Jeep faz parte. Foi também o primeiro modelo da marca a ganhar, em 2024, o mais conceituado prémio da indústria automóvel, o The Car Of The Year, do qual tenho a honra de fazer parte do júri.

Mas faltava-lhe uma coisa. Faltava-lhe uma versão com tração às quatro rodas. Não porque os AWD tenham uma procura imensa na Europa. Na verdade, os seus mercados estão nos países mais invernosos do Norte e nas redondezas das estâncias de desportos de neve, nos mais a Sul. Mas o Avenger não podia ser o modelo a deixar cair a tradição dos Jeep 4×4. A Stellantis sabia disso. E, apesar de a plataforma CMP não ter sido pensada para receber um sistema 4×4, o assunto foi estudado ao detalhe.
4Xe em detalhe
A solução acabou por ser maior do que o problema, ou seja, trouxe mais benefícios do que aqueles que se poderiam esperar. Isto porque, em vez de um sistema tradicional mecânico, que teria de ser básico para não subir muito os custos, a Jeep preferiu seguir outro caminho, mais atual e mais pragmático. Começou pela versão “mild hybrid” de 48 Volt, que usa o motor a gasolina 1.2 turbo de três cilindros na versão de 136 cv, a que se junta um motor/gerador elétrico de 21 KW (29 cv) alojado numa caixa automática de dupla embraiagem e seis relações. Este conjunto traciona as rodas da frente.


Para as rodas de trás, foi instalado um motor elétrico de configuração diferente mas com os mesmos 21 KW (29 cv) e um diferencial aberto com uma relação final que multiplica o binário às rodas, a baixa velocidade. Mas, para tudo isto poder ser instalado na plataforma CMP, foi preciso substituir a suspensão traseira de barra de torção por uma suspensão inteiramente independente, mantendo a bateria de 0,89 kWh (0,43 KWh úteis) da versão “mild hybrid” sob o banco do condutor.
Mais modos
A potência máxima combinada é de 145 cv e o sistema funciona de três maneiras diferentes, consoante o modo de condução escolhido (Auto/Snow/Sand & Mud/Sport) e a velocidade. Entre os 0 e os 30 km/h, nos modos para “off-road” as quatro rodas recebem sensivelmente o mesmo binário continuamente. Entre os 30 e os 90 km/h o sistema funciona sobretudo como tração à frente, com intervenções pontuais da tração atrás se o sistema assim achar conveniente. Acima dos 90 km/h, a tração é sempre apenas às rodas da frente. No modo Sport, graças a um “boost” de energia fornecido pelo motor elétrico da frente, o modo 4×4 prolonga-se até aos 40 km/h.


No papel, não parece muito convincente, sobretudo para um Jeep, mas só um teste com obstáculos reais poderia tirar as dúvidas. Já lá vamos, porque o 4Xe tem mais diferenças em relação às outras versões do Avenger, sobretudo no que respeita a maior proteção da carroçaria, mecânica e interiores de uma utilização fora de estrada alcatroada. Desde logo, tem pneus 215/60 R17 GoodYear Vector 4 Seasons M+S, com opção por pneus “off road” mais radicais.
Anti-riscos
Os para-choques são anti-riscos, ou seja, são de plástico pintado na massa, não têm tinta à superfície. As forma dos dois para-choques foram redesenhadas para melhorar os ângulos de ataque e de saída. O radar está melhor protegido, bem como os faróis de nevoeiro que foram redesenhados. Há novas barras no tejadilho e os logotipos são em preto. Mais importante, foi colocada uma placa de aço sob o motor.


No habitáculo, a decoração joga com materiais em preto com linhas verdes, o tecido dos bancos contém uma percentagem de poliuretano para o tornar mais resistente e fácil de lavar. De resto, há três níveis de equipamento: Upland, Overland e North Face, o último numa associação com a conhecida marca de roupa “outdoors”. A estrutura geral do interior não mudou, com utilização exclusiva de plásticos duros, mas com um acabamento superficial razoável.


Continua a haver um porta-objetos grande na consola, com tampa magnética e um ecrã tátil destacado a meio do tablier. O espaço nos lugares de trás não é muito generoso, nem em comprimento para os joelhos, nem na altura ou acesso, nem em largura. A mala perdeu capacidade devido à suspensão multi-braço e ao motor/diferencial traseiros, baixou de 321 para 262 litros.
Asfalto e terra
Comecei este Primeiro Teste TARGA 67 pelo asfalto, por vezes em mau estado, no Norte de Itália. Reencontrei uma boa posição de condução, com um volante de boa pega e banco confortável, com apoio lateral suficiente. O botão dos modos de condução, que aqui se chamam “Selec Terrain” é o mesmo dos outros modelos que usam esta plataforma, o Jeep merecia diferente. O painel de instrumento tem um gráfico que mostra a atribuição de binário instantâneo pelas quatro rodas. A suspensão traseira acrescenta conforto, que já era um ponto a favor do Avenger. E acrescenta também melhor estabilidade em mau piso, além de ajudar a fazer rodar o Avenger em curva, com um pouco menos de subviragem, quando se exagera.



A Jeep anuncia uma velocidade máxima de 194 km/h e aceleração 0-100 km/h em 9,5 segundos, melhor que os 184 km/h e os 10,4 segundos da versão e-Hybrid 4×2, que é 187 kg mais leve, mas tem 35 cv menos. A diferença sente-se, tanto na parte elétrica a baixa velocidade, como no que respeita ao motor a gasolina, muito suave, com uma boa sensação de binário, sobretudo nos regimes intermédios, os mesmso onde a caixa de dupla embraiagem melhor opera.
Comportamento bom
Em estrada secundária, mesmo com muitas curvas, são raras as situações em que se rola a menos de 40 km/h por isso, na prática, o Avenger funciona como um tração à frente quase sempre, saindo de frente nos exageros, mais devido ao tipo de pneus. Contudo, numa sequência de ganchos lentos, deu para perceber como o motor traseiro ajuda a colocar o binário no chão, sem perdas de tração e como dá também um contributo para uma atitude neutra.

As patilhas do volante permitem passagens de caixa razoavelmente rápidas e existe um verdadeiro modo “M” que não faz mudanças quando quer. O que faz é um pouco de regeneração, sensível sobretudo em trânsito citadino, ambiente onde os motores elétricos conseguem levar o 4Xe sozinho durante algumas dezenas de metros consecutivos a velocidades baixas.



Mas o que eu queria saber era como o sistema 4Xe se comportava em pisos de terra. Comecei por um caminho em bom estado, mas com muita pedra solta, que mostrou como o conforto se mantém, mesmo nestas condições. Depois usei o Hill Descent Control para uma descida mais íngreme. Engrenando D, a velocidade máxima é de 7 km/h, passando a N, a velocidade máxima desce aos 4 km/h. Funciona bem e dá um extra de confiança, até porque a posição dos comandos da transmissão, numa linha de teclas físicas a meio da consola, é tudo menos prático.
A vantagem elétrica
A Jeep diz que o 4Xe sobe inclinações até 40%, contra os 20% da versão híbrida de tração à frente. Não encontrei subidas prolongadas tão íngremes, mas o que percebi foi que a maneira ultra-suave como o motor elétrico traseiro passa binário ao solo, permite fazer tudo a velocidades muito baixas, com total serenidade, sem perder tração e sem necessidade de fazer o motor a gasolina subir muito de regime. Num cruzamento de eixos com roda traseira no ar, o sistema 4Xe resolveu facilmente a situação.


Finalmente, numa zona de lama, a muito baixa velocidade e com o modo “Mud & Snow” ligado, deu para perceber mais uma vez as vantagens que os motores elétricos têm neste tipo de condições, conseguindo ir buscar tração com enorme facilidade e sem que o condutor tenha que ser um especialista em condução fora de estrada. A razoável altura ao solo impediu que o fundo tocasse no chão muitas vezes e os ângulos “off road” evitaram ter que testar os para-choques anti-riscos. Também não testei ainda os consumos.
Conclusão
A Jeep cumpre assim a promessa que tinha feito desde o dia em que lançou o Avenger, a de ter uma versão 4×4. É claro que nunca poderia ser um todo-o-terreno como os maiores da marca, nem a plataforma o permitiria. Mas com um sistema “mild hybrid” e um motor elétrico, encontrou mais respostas do que as perguntas que tinha. O acréscimo de preço para o e-Hybrid de 110 cv é de 4000 euros, o que talvez se justifique para quem goste de participar em passeios fora de estrada bem organizados.
Jeep Avenger 4Xe
Potência: 145 cv
Preço: 34 250 euros
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