A primeira geração da Ranger Raptor já tinha colocado a pick-up desportiva da Ford num patamar intocável, mas apenas tinha motor Diesel. A segunda geração acrescenta um motor V6 biturbo a gasolina e muitas evoluções que fui testar a um sítio incrível.
Quem guiou uma das 8000 Ranger Raptor da primeira geração que se venderam na Europa, certamente teve uma experiência de condução como não há igual.
Uma pick-up de vocação vincadamente desportiva, feita pelo departamento Ford Performance na Austrália, é algo que, pura e simplesmente, não tem rivais diretos.

Para esta segunda geração, a Ford tinha uma missão difícil: melhorar um produto que tinha recebido muito poucas críticas. Mas enfrentou o assunto e introduziu na gama europeia aquilo que faltava, um motor 3.0 V6 biturbo a gasolina.
Não se assustem os adeptos do Diesel, pois o anterior motor a gasóleo de 205 cv e 500 Nm vai voltar à Raptor no segundo semestre de 2023. Mas no início do ano a primeira versão a chegar vai ser mesmo o Ecoboost V6 3.0 biturbo com os seus 292 cv e 491 Nm, sistema “anti-lag” e dimensões reduzidas.
Concebida na Austrália
No mercado australiano, devido às menores exigências em termos de emissões poluentes, a Raptor chega aos 400 cv com este motor, que os técnicos consideram ser o limite. A Ford reforça que são ambos motores de sua conceção.

A equipa australiana que desenvolveu a primeira e segunda gerações da Raptor é composta por entusiastas, que viram aqui uma oportunidade de evoluir a pick-up para um plano superior, por isso as novidades vão muito além do novo motor.
A começar pelo estilo, partilhado pelas outras versões da nova Ranger, mas com os habituais alargamentos de guarda-lamas e jantes com pneus BF Goodrich “off road” de medida 285/70 R17.

Também marca presença um arco de segurança atrás da cabine dupla e vários detalhes decorativos. Uma coisa é certa, a nova frente com faróis em “C” e o nome do fundador da companhia em letras gigantes, aumenta consideravelmente o visual agressivo desta nova Raptor fabricada na Tailândia.
Para durar
Por dentro, a qualidade dos materiais não se alterou, sendo quase todos os plásticos duros e, espera-se, duráveis. Há aplicações em tecido e imitação de fibra de carbono bem como apontamentos em cor de laranja e pele.

A maior novidade é o ecrã tátil central de grandes dimensões, tem 12,4” e está colocado na vertical, incluindo as mais recentes soluções de conetividade e imagens de vídeo captadas pelas câmaras exteriores que permitem uma visão 360 graus do que se passa à volta. Muito útil, como se veria mais à frente.
O painel de instrumentos também é digital e a posição de condução não é como num SUV, as pernas não vão tão verticais, o volante tem uma pega excelente, nem faltando patilhas de Magnésio para a nova caixa automática de dez relações.

O banco é confortável e tem o apoio lateral necessário mas, claro, subir ao posto de condução exige usar o estribo anti-derrapante exterior e agarrar na pega colocada no pilar dianteiro do tejadilho.
Acessórios são 140
No tejadilho, junto ao retrovisor, há uma linha de botões preparados para ligar alguns dos 140 acessórios disponíveis, por exemplo um guincho elétrico, um compressor de ar ou faróis suplementares.

Na consola há um botão rotativo para os sete modos de condução: Normal/Sport/Slippery/Rocks/Mud-ruts/Sand/Baja. No mesmo botão pode configurar-se a transmissão entre as posições 2H/4A/4H/4L e ainda um botão que abre a página do infotainment dedicada à condução offroad.

Aqui está a câmara de vídeo e os botões virtuais para bloquear o diferencial traseiro e o dianteiro, o da frente é novidade. Além do botão para ligar o Trail Control, um cruise control para condução fora de estrada que funciona abaixo dos 32 km/h.

Mas ainda há mais botões específicos da Raptor. No volante, há um botão para a direção e outro para a suspensão, que regulam a assistência e o amortecimento em três níveis. Há ainda um terceiro botão, para regular o som do escape em quatro níveis, que atua válvulas no escape e um sintetizador que emite som pelos altifalantes.
Muitas evoluções
A Raptor, como todas as Ranger, continua a usar um chassis de longarinas e travessas, reforçado sobretudo na frente e uma carroçaria que é montada através de apoios de borracha e dois apoios hidráulicos. São estes os responsáveis pelo quase nulo ruído de rolamento em autoestrada, mesmo com os pneus “off road.”

A distância entre-eixos subiu 15 mm, chegando aos 3270 mm e diminuindo o vão dianteiro. Os ângulos de todo-o-terreno são agora os seguintes: ataque – 32; saída – 27 e ventral – 24. A altura ao solo é de 272 mm e a passagem a vau de 850 mm.
Uma nova transmissão
Uma das grandes evoluções foi o abandono da transmissão clássica, com tração traseira permanente e dianteira inserível, em favor de uma transmissão e-AWD integral permanente, com embraiagem multidiscos central.

Claro que há redutoras e também a possibilidade de ter apenas tração às rodas de trás, mas apenas para condução lúdica, não para fazer baixar consumos, para isso serve a posição 4A que distribui o binário pelas quatro rodas de forma automática.
Amortecedores Fox são as estrelas
Tal como na primeira Raptor, os quatro amortecedores Fox são o componente mais sofisticado e o mais caro. E também evoluíram com tecnologia Live Valve, de válvulas internas que atuam de acordo com a posição, para um controlo mais preciso e versátil dos movimentos de compressão e extensão.

O software que os comanda individualmente, parte de três níveis de amortecimento base, mas varia a força até um máximo de 3000 Nm, de acordo com as circunstâncias, usando os sensores presentes para antecipar situações. Por exemplo, durante um salto, o sistema deteta que as quatro rodas estão no ar e prepara o amortecimento para a “aterragem”.
Primeiro no asfalto
Este primeiro teste foi invulgarmente completo começando pela autoestrada, onde os ruídos aerodinâmicos estão muito bem controlados, tal como os movimentos parasitas da carroçaria. Sente-se que vamos a bordo de uma “pick-up” mas o amortecimento faz tudo para o disfarçar.

O motor V6 biturbo a gasolina tem um som que agrada ao ouvido e sobe de regime com facilidade. A caixa de velocidades, em modo”D”, é suave e tem uma estratégia de passagens bem adaptada.
Seguiu-se um percurso em estrada secundária com exigentes sequências de curvas médias e lentas. Passando do modo Normal ao Sport, o aumento de “peso” da direção é pouco e nem é preciso, pois a assistência está muito bem calibrada.

A direção é francamente mais direta que na Raptor anterior, inserindo a frente em curva com maior rigor e rapidez. Mas a subviragem surge um pouco mais cedo, precisamente porque a rapidez de entrada é maior. Seja como for, os pneus “off road” também não ajudam.

Em modo manual, a caixa obedece relativamente bem às “patilhadas”, mais a subir que a descer. Mas, mais uma vez é o controlo da carroçaria a brilhar, sem inclinação excessiva em curva, nem mergulhos nas travagens mais fortes. As performances são muito boas, com os 0-100 km/h a chegar em 7,9 segundos, o que é notável para um peso total de 2454 kg.
Todo-o-terreno a sério
A parte mais interessante deste primeiro teste desenrolou-se numa propriedade privada, numa zona montanhosa perto de Barcelona, com uma enorme variedade de trilhos e caminhos, quase sempre com piso de base rochosa

E os primeiros quilómetros mostraram logo que os amortecedores proporcionam um excelente nível de conforto, mesmo nos pisos mais difíceis. A direção filtra muito bem as passagens em regos e sobre pedras, escolhendo o modo “Mud-Ruts”; e o acelerador é fácil de dosear, mesmo a velocidades muito baixas.
Numa subida muito íngreme e longa, com muitas pedras soltas, foi possível ver a ajuda que dá o bloqueio do diferencial da frente, depois de uma primeira tentativa frustrada apenas com o de trás bloqueado. Em 4L, redutoras, a Raptor avança com suavidade e com o V6 apenas a “ronronar” pela ladeira acima.
“Cruise control” para TT
Noutra subida com menos pedra solta, mas mais curvas fechadas e regos profundos que deixavam as rodas no ar, à vez, o Trail Control mostrou como um “cruise control” para fora de estrada pode trabalhar tão bem. Basta rodar o volante e deixar o sistema gerir o acelerador, de acordo com a velocidade escolhida, que em alguns locais não passou de 2 km/h.

As descidas íngremes são tratadas de forma igualmente eficiente pelo Trail Control, desta vez usando a função Hill Descent Control. É verdade que se chega a um ponto em que os sistema da Raptor fazem quase tudo, acabando por ser mais impressionante observar as manobras de fora, do que estar ao volante a seguir as indicações dos instrutores apeados.

Uma curva à direita, com um declive interior acentuado colocou a roda traseira mais de um metro no ar e deixou ver a maneira como um eixo rígido atrás continua a ser a melhor opção, bem coadjuvado por uma suspensão independente de braços sobrepostos em alumínio na frente.
Um rio de pedras
O obstáculo mais lento a ultrapassar foi uma espécie de rio seco com enormes blocos de pedra. O curso da suspensão, aumentado nesta geração, ajudou a subir e descer pedras que, ao volante pareciam intransponíveis e criando acentuadas inclinações laterais que a Raptor suportou sem problemas.

A suavidade do V6 biturbo a gasolina e a sua facilidade de dosear o acelerador tornam tudo mais fácil do que com o motor Diesel. Apenas numa situação a chapa de 2,3 mm que protege o fundo roçou ligeiramente numa pedra.
Modo Baja a fundo!
O teste final foi o mais divertido. Usando uma pista de terra que mais parecia um troço de rali, com curvas lentas e rápidas e nem faltando um salto, foi altura de testar o modo Baja, que atrasa a entrada do ESC, liga o anti-lag que funciona por períodos de três segundos, aumenta o som do escape e ajusta o amortecimento.

Com a caixa em modo manual, foi altura de acelerar a fundo e ver como a transmissão consegue ir passando potência da frente para trás ao descrever curvas longas, terminando-as com um pouco de sobreviragem.
Provocando a traseira na entrada, é possível descrever a curva numa deriva controlada com o V6 a cantar quase como um motor de competição.

Mesmo com algumas secções da pista já um pouco degradadas pela passagem de várias Raptor, a suspensão conseguiu processar o piso sem incomodar a estabilidade.

Claro que o momento mais emocionante de cada volta foi o salto, impressionando a maneira como a suspensão fazia a aterragem, de uma só vez, sem ressaltos, quase como um gato.
Conclusão
A nova Raptor com o motor V6 a gasolina não é barata, custa 83 873 euros, mas aquilo que o motor a faz ganhar em carácter e performance vale bem o dinheiro em relação à versão Diesel. Claro que se trata de uma “pick-up” que tem a diversão como principal objetivo, mas, à exceção dos 5,4 metros de comprimento e 2,0 de largura, não se dá nada mal com uma utilização comum. Os principais contras são o desconforto dos lugares de trás e a caixa de carga que, mesmo com uma persiana de enrolar, não é a maneira mais prática de carregar as bagagens de uma família. Neste teste, a média geral de consumos andou pelos 24 l/100 km, mas numa condução típica de um primeiro teste, muitas vezes depressa e com várias horas de redutoras ligadas. Sendo um veículo essencialmente de lazer, talvez esta questão não tenha grande importância para os potenciais compradores.
Francisco Mota
Ford Ranger Raptor Ecoboost V6 3.0 biturbo
Potência: 292 cv
Preço: 83 872 euros
Veredicto: 4 (0 a 5)
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