Desportivos como estes já há poucos, o mercado virou-se para os SUV e para os elétricos. Contudo, o Audi S3 quattro e o BMW M135 xDrive nunca foram tão bons como agora. Para quem aprecia um bom familiar compacto desportivo a gasolina, tem aqui uma escolha difícil. Nós damos uma ajuda, em mais um Comparativo TARGA 67, conduzido por Francisco Mota e fotografado por João Apolinário.

Durante anos, ter um familiar compacto desportivo foi a aspiração de muitos entusiastas. A receita era perfeita: a uma carroçaria que cumpria o essencial das tarefas do dia-a-dia, juntava-se um motor mais potente que a média, uma suspensão capaz de transformar os “cv” em sorrisos, rematando com detalhes de estilo típicos de um desportivo. A fórmula foi generalizada pelo primeiro VW Golf GTI de 1976, depois reformulada quando a BMW lançou o Compact com motor de seis cilindros em linha e novamente a VW com o primeiro VR6. Aqui já estávamos a falar de um segundo nível de prestações que a Audi também seguiu com a primeira geração do S3. Claro que os preços eram mais elevados do que o de um GTI “normal”, mas a performance valia o esforço.
Os restylings
O nicho dos familiares compactos desportivos nunca deixou de existir, até ganhou algum ímpeto com o lançamento do Golf R, que teve mais sucesso do que o esperado em alguns mercados como o alemão e o do Reino Unido. São esses mercados que mantêm vivos os dois modelos que tenho neste comparativo, o Audi S3 Sportback quattro e o BMW M135 xDrive. Ambos receberam atualizações importantes, um restyling no caso do S3 e um super-restyling, no caso do M135. As modificações são maiores do que pode parecer olhando para os dois, lado a lado, prontos para serem “alvejados” pelas objetivas do João Apolinário.



O S3 recebe as alterações estéticas dos outros A3, com uma nova grelha, novos para-choques à frente e atrás, novos faróis e novas luzes traseiras. Por dentro, há um novo comando da caixa, deslizante, novas saídas de ar da climatização, novo volante, nova iluminação ambiente e novos revestimentos. O infotainment também é novo e tem uma “loja” para comprar o desbloqueio de algumas funções que estão instaladas mas não estão ativas.
O que muda no S3
Mais interessantes são as evoluções técnicas face à primeira versão desta quarta geração do S3. A começar pelo motor EA888, o lendário quatro cilindros em linha turbocomprimido do grupo VW. Recebeu uma nova gestão geral do motor e outra apenas do turbo, para reduzir o tempo de resposta e aumentar as prestações. A potência subiu 23 cv, para os 333 cv e o binário para os 420 Nm, mais 20 Nm. A caixa de dupla embraiagem e sete relações também tem uma nova gestão, que permite reduzir a metade o tempo das passagens, quando se vai de acelerador a fundo. Mas a grande novidade é a inclusão de série de um diferencial traseiro eletrónico. Tem duas embraiagens multidiscos, uma para cada semi-eixo, de forma a enviar mais binário para a roda pretendida, de acordo com o modo de condução escolhido. A suspensão MacPherson dianteira tem novos topos, mais firmes e que permitem um camber de 1,5 graus, o dobro da versão anterior. Os braços das suspensões e os casquilhos são mais rígidos e os amortecedores também são novos e mais firmes. Por fim, os discos de travão são de 357 mm, à frente, com maxilas de dois êmbolos.





Talvez não pareça, mas o Série 1 recebeu um restyling ainda mais profundo que o A3, que autoriza a BMW a dizer que se trata de uma nova geração, também a quarta, se bem que baseada na mesma plataforma da anterior. Tudo começa pelo desenho dos faróis, da grelha e dos para-choques, que na versão M135 xDrive são mais vincados. O mesmo para as luzes de trás, retocadas e para o desenho das jantes. Mas só colocando este M135 xDrive ao lado do anterior M135i xDrive se conseguem ver as diferenças. A falta do “i” justifica-se porque essa letra passou para os elétricos da BMW.
O que muda no M135
Mas também há mudanças técnicas, desde logo na caixa de velocidades, que deixa de ser automática de oito com conversor de binário para passar a ser de dupla embraiagem e sete relações. A BMW regista também um aumento da rigidez estrutural, nova calibração da direção e mais 20% de ângulo de “caster”, barras estabilizadoras com pré-carga e novos amortecedores sensíveis à frequência, também de acordo com o modo de condução escolhido. A transmissão não tem diferencial traseiro eletrónico como tem o S3, usa a travagem seletiva das rodas. O motor 2.0 turbo de quatro cilindros debita 300 cv e 400 Nm, ligeiramente menos que na versão anterior que tinha 306 cv e 450 Nm, presumivelmente para baixar as emissões poluentes, no primeiro caso e para manter a caixa de velocidades na sua zona de conforto, no caso do binário. Curiosamente, o peso é muito próximo, com o BMW a marcar 1625 kg e o Audi a ficar pelos 1610 kg.






Por dentro, o Série 1 também recebeu modificações, a mais importante é a presença da peça monolítica que agrega o painel de instrumentos e o monitor central tátil. E a correspondente diminuição drástica de botões na consola, além da ida do iDrive para a reforma. O volante continua a ter teclas físicas mas o botão balanceiro da transmissão colocado entre os bancos é mínimo, ladeado por outros botões hápticos de utilização menos intuitiva. O mesmo se pode dizer dos comandos das grelhas da climatização.
Moderno ou clássico?
Comparando os dois habitáculos, o que posso dizer é que o tablier do M135 é claramente mais moderno e os materiais usados inspiram uma maior sensação de qualidade. Pelo seu lado, o S3 tem um módulo de comando da climatização separado do monitor central e um friso de botões físicos. São soluções mais antigas, mas que continuam a funcionar melhor. A decoração do interior do M135 também é mais atual e a remoção de botões da consola, permitiu oferecer mais porta-objetos.






Em termos de espaço, o M135 transmite a sensação de ter um tejadilho mais baixo, sem que isso o prejudique nos lugares da frente. Mas, na segunda fila, o S3 tem um pouco mais de espaço em altura e largura. Ambos têm um problema que resulta da existência de tração às quatro rodas e de veios de transmissão: dois túneis centrais que incomodam muito o passageiro do meio. As malas têm formas muito fáceis de aproveitar e volumes de 325 litros, no S3 e de 380 litros, no M135.
Ao volante
As posições de condução são ambas relativamente baixas, num mundo cada vez mais dominado pelos SUV. A posição relativa do volante, pedais e banco é muito boa nos dois e com ajustes suficientemente amplos. O S3 é melhor só porque tem bancos desportivos com maior apoio lateral e um volante circular com um aro da espessura certa. Os bancos desportivos do M135 não são tão… desportivos e são um pouco mais duros, o volante tem um aro demasiado grosso, como todos os volantes M. O S3 tem também melhor visibilidade para fora, sobretudo para trás.






Comecei pelo S3 e pelo circuito urbano, onde o Audi se mostrou perfeitamente à vontade. A suspensão é firme mas não é brusca sobre irregularidades, tem um pisar “caro” que se justifica pelos amortecedores adaptativos. A direção não é demasiado leve mas não dificulta as manobras e os pedais são fáceis de dosear. Nem a Audi, nem a BMW equiparam estes desportivos com sistemas híbridos. A caixa de velocidades é suave, em modo automático e obediente, usando as patilhas. Fora a suspensão firme e o som do escape, quase diria que estava ao volante de uma versão inferior do A3, mas os consumos tiram qualquer dúvida. Em modo Efficiency, A/C “off” e caixa em “D” registei uma média em cidade de 11,4 l/100 km. Um valor aceitável, tendo em conta as especificações do S3, mas mais alto do que qualquer outro A3.
Consumos
Estacionei o S3 e passei para o carro do lado, o M135, para fazer o mesmo exercício. A maior diferença vem da suspensão que se mostrou claramente mais firme que a do S3, os amortecedores sensíveis à frequência não são tão clementes com o mau piso como os adaptativos do S3. A direção também não é demasiado leve e o raio de viragem curto facilita as manobras. O pedal de travão pode ser um pouco brusco, nas travagens a baixa velocidade, mas a caixa é suave em “D” e reage bem ao uso das patilhas. No teste de consumos reais em cidade, em modo Personal, A/C desligado e com a caixa em “D”, obtive uma média de 10,1 l/100 km. Uma boa vantagem face ao S3.



O próximo teste foi numa autoestrada nacional, infelizmente o orçamento do TARGA 67 não permitiu levar estes dois desportivos para a Alemanha, mas acredito que os 250 km/h limitados anunciados pelos dois sejam reais. A ritmos legais, o M135 tem movimentos verticais mais curtos e secos, quando aparecem pequenas lombas ou depressões. No que diz respeito aos ruídos aerodinâmicos e de rolamento, são reduzidos em ambos e equivalentes. Já quanto ao escape e motor, não se pode falar de ruído mas de som e o produzido pelos escapes Akrapovic de quatro saídas do S3 é bem mais entusiasmante, no M135 soa demasiado sintetizado. Voltando aos consumos reais a 120 km/h estabilizados, o M135 fez 6,7 l/100 km e o S3 subiu ligeiramente aos 6,9 l/100 km. São valores muito bons, ótimos para aquelas situações em que a tarefa a cumprir é apenas a de transportar.
BMW M135 xDrive bem dinâmico
Confesso que a maior parte do tempo deste teste passei-o numa estrada secundária, com curvas exigentes e longe de tudo e de todos. Desta vez, comecei pelo BMW que tem só três modos de condução: Personal/Comfort/Sport mas o modo Sport é configurável na resposta do acelerador (3 níveis), ESC (Sport/Sport+ e desligado) e na assistência da direção (2 níveis). Escolhi o modo Sport no nível máximo do acelerador, ESC desligado e direção no nível mais leve, o menos assistido não acrescenta nada em estradas deste tipo.


Primeira aceleração a fundo e o motor sobe de regime de forma linear e determinada, a BMW anuncia os 0-100 km/h em 4,9 segundos. O som de motor, que vem dos altifalantes, é artificial mas contribui para o ambiente a bordo. Na primeira travagem forte, os discos bi-matéria perfurados mostraram a sua potência, que não se degradou ao longo de várias passagens. A caixa aceita reduções ligeiramente antecipadas e depois chega a vez da suspensão e dos pneus fazerem o seu trabalho. Uma entrada mais violenta em curva mostra como a suspensão mantém a estabilidade, com pouca inclinação lateral, dando aos pneus 235/40 R19 as condições ótimas para evitar a subviragem.



Depois, o M135 mantém uma atitude neutra que passa a ligeiramente sobreviradora quando se volta a carregar forte no acelerador, terminando a curva com o volante quase direito, sentindo o carro a rodar ao longo da curva de forma muito natural. Claro que, exagerando com a velocidade de entrada em curva, é possível encontrar uma ligeira saída de frente, mas muito fácil de resolver. Há uma boa interação entre a suspensão, transmissão e o condutor, que permite usar técnicas de condução de carros de tração só à frente, por exemplo uma desaceleração brusca na entrada, para obrigar a traseira a iniciar a rotação e fazer um “by-pass” à subviragem. Depois é só acelerar forte para extrair o M135 da curva, sempre com forte tração e cada roda a fazer o seu papel. Eficiente e envolvente de guiar, sem dúvida, muito à custa da travagem seletiva.
Audi S3 quattro superlativo
Voltei depois para o S3 que, ao contrário do M135 não tem na pressão prolongada da patilha da esquerda o acesso à função “Boost”, que coloca o modo Sport ativo durante uma contagem decrescente de 10 segundos, quando se leva outro modo selecionado. Pode ser útil numa ultrapassagem, mas não faz mais do que um “kick down” do acelerador. O que o S3 tem são mais modos de condução, comandados por um botão na consola, que estaria melhor no volante. São eles: Efficiency/Comfort/Auto/Dynamic/Individual e um modo “escondido” Dynamic Plus. Os parâmetros que são alterados são o diferencial eletrónico ou “torque splitter”/acelerador/amortecimento/assistência da direção e som sintetizado do motor, todos em três níveis. Há ainda um botão para as três posições do ESC: On/Sport/Off.


Comecei pelo modo Dynamic com o ESC em Sport e bastou a primeira aceleração a fundo para perceber que os 0-100 km/h anunciados de 4,7 segundos representam mais do que as duas décimas de vantagem face ao M135. O motor é mais poderoso, sobe até às 6500 rpm com maior rapidez e tem mais força a todos os regimes. O tempo de resposta do turbo é quase totalmente colmatado pela caixa s-tronic, muito rápida e obediente, acompanhada por detonações no escape durante desacelerações bruscas. Também a direção tem um tato mais rigoroso, colocando a frente ao milímetro na linha escolhida. Tal como o M135, o S3 também tem discos ventilados e perfurados, não só à frente mas nas quatro rodas, que lhe dão um poder de imobilização ainda mais forte e resistente. Os pneus 235/35 R19 são ligeiramente mais baixos, mas o amortecimento adaptativo compensa, resultando em maior estabilidade, quando o piso é pior.



Atirando o S3 para dentro de uma curva média, a frente resiste ainda mais e durante mais tempo à subviragem, autorizando velocidades de entrada em curva mais altas. Depois, entra em ação o diferencial eletrónico traseiro, que ajuda o S3 a rodar na primeira metade da curva, começando logo quando se desacelera. Isto permite voltar ao acelerador ainda mais cedo que no M135 e terminar a curva com uma genuína saída de traseira em potência, oferta do diferencial traseiro. É certo que ambos os modelos partem de plataformas nascidas para tração à frente, com uma embraiagem multidiscos a passar um máximo de metade da potência para o eixo de trás. A diferença está nas diversas maneiras como o diferencial traseiro eletrónico do S3 consegue distribuir essa potência pelas duas rodas de trás. Passando ao modo Dynamic Plus, que só está visível a partir do Dynamic, entra-se noutra realidade.
Dynamic Plus
A gestão do acelerador passa a ser um pouco mais agressiva e o motor só corta às 7000 rpm, o diferencial passa mais binário e mais cedo para a roda traseira exterior. O resultado de ambas as ações e do ESC em off é uma atitude em que a sobreviragem ganha protagonismo, sendo possível controlar boa parte da atitude em curva com o pedal da direita e com o volante. Mas sempre com a frente a ajudar na colocação da potência no chão. Faz lembrar alguns dos melhores desportivos de tração às quatro rodas dos anos 1990, que serviram de base a máquinas de ralis de Grupo A.



Só que muito mais rápido! Este S3 está tão bem afinado que mais parece um RS3, sobretudo no modo Dynamic Plus tem um tato de condução super-informativo que desperta os sentidos e exige concentração. Não porque o comportamento seja repentino, mas porque é tão entusiasmante que “obriga” o condutor a empenhar-se para estar à altura daquilo que o S3 tem para dar. O único asterisco é o piso molhado, situação em que o Dynamic Plus se pode tornar num desafio a exigir alguma experiência.
Conclusão
Quase não seria preciso escrever uma conclusão deste comparativo, pois o resultado é fácil de adivinhar. O BMW M135 xDrive é um desportivo compacto divertido de guiar depressa e competente em todas as outras situações, tirando o facto de ter uma suspensão firme. Tem um interior mais moderno e maior sensação de qualidade, além de consumir menos em cidade. Mas o Audi S3 Sportback quattro é uma máquina mais focada no verdadeiro prazer da condução, sem perder grande coisa em termos de utilização diária, até é mais confortável. A Audi levou esta fórmula a um estado de refinamento superlativo. E por um preço, sem opcionais, que fica só 4600 euros acima do M135. É caso para dizer que o melhor será aproveitar enquanto ainda se fazem carros destes.
Francisco Mota
Audi S3 Sportback quattro
Potência: 333 cv
Preço: 65 631 euros*
Veredicto: 5 estrelas
BMW M135 xDrive
Potência: 300 cv
Preço: 61 000 euros*
Veredicto: 4 estrelas
*preços sem opcionais
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