Numa altura em que o Grupo Renault anuncia o seu regresso aos pequenos desportivos, com o Alpine A290 elétrico, fui rever as minhas memórias do dia em que viajei no tempo e guiei um R5 GT Turbo novo, o herói dos anos oitenta que inspirou esta nova versão elétrica. Um Teste TARGA 67 com muitas emoções.
A Renault estava a celebrar os 50 anos da sua primeira vitória na Fórmula 1, que foi também a primeira de um motor turbocomprimido na disciplina máxima do desporto automóvel. Para comemorar a data, foi buscar ao seu museu alguns modelos que fizeram a história da sobrealimentação na marca.

Um desses modelos foi o R5 GT Turbo, um pequeno desportivo que marcou todos os que se interessavam por automóveis nos anos oitenta. A ponto de servir de inspiração para o novo Renault 5 elétrico e para a sua derivação desportiva, o Alpine A290, também elétrica, que foi agora apresentada.
Alpine A290 chega em 2024
O A290 será lançado em 2024, tendo sido mostrado um primeiro concept-car com 4,05 metros de comprimento e um acabamento desportivo da carroçaria, que a marca diz estar próximo da versão final.

O concept-car tem dois motores elétricos que movem as duas rodas da frente, prometendo uma sofisticada vetorização de binário. Mas a versão final vai usar só um motor, o mesmo de 225 cv do Mégane E-Tech elétrico.
Guiar um R5 GT Turbo “novo” em 2021
Quanto à oportunidade de guiar um R5 GT Turbo absolutamente como novo em 2021, pareceu-me quase irreal. Mas aconteceu, pois tratava-se de uma unidade da própria marca, que foi diretamente da linha de produção para o museu da Renault, em 1985.

Sem medo que pudesse sofrer algum dano, os responsáveis da Renault Classic trouxeram o R5 GT Turbo para uma pequena pista algures em França e colocaram-no à minha disposição para umas quantas voltas.
Na verdade, o R5 GT Turbo foi daqueles carros que “falhei” no início da minha carreira jornalística. Na altura, ainda guiei outros modelos do mesmo tempo, como o R21 Turbo, mas já não surgiu a oportunidade de deitar as mãos ao R5 GT Turbo, pois a gama R5 estava a ser substituída pelo primeiro Clio, que foi o protagonista do meu primeiro teste como jornalista.
Finalmente ao volante do GT Turbo
Por isso, foi com curiosidade acrescida que abri a porta e me sentei ao volante deste verdadeiro ícone dos pequenos desportivos, ou dos “hot hatches”, como hoje se diz. Um carro que teve muita utilização no desporto automóvel nacional e internacional, em pista e em ralis, de asfalto ou de terra.

As memórias de o ver correr em Portugal, no troféu de velocidade e nos ralis nacionais, estão bem vivas, tal como a de ler sobre a sua incrível vitória no rali da Costa do Marfim de 1989, na altura uma prova do WRC. E isto com um carro inscrito na classe mais próxima dos carros de série, o Grupo N.
Aspeto futurista
A carroçaria de três portas rebaixada, as jantes de liga com desenho futurista e as aplicações em plástico, incluindo alargamentos de guarda-lamas, estavam bem presentes na memória.
Mas o habitáculo foi uma relativa surpresa, por nunca ter entrado em nenhum ao longo de todos estes anos. Esta unidade da Renault tinha apenas 1767 km registados no conta-quilómetros e quase que ainda “cheirava a novo”.

O estado imaculado do interior só é possível num carro que pouco andou e que esteve sempre conservado nas condições ótimas de humidade e temperatura. Uma verdadeira viagem no tempo.
De volta aos anos 80
Ao banco não falta apoio lateral, mas com uma linha de cintura tão baixa, até parece que a posição de condução é alta. O volante de três braços forrado a pele está muito bem posicionado e a sua pega é muito boa, apesar de ter um perímetro grande, para os padrões atuais.

A alavanca da caixa também está bem colocada, tal como os pedais, se pensarmos que o comprimento deste “Supercinco”, como era conhecida esta segunda geração, é de apenas 3,59 m. Ainda assim, o espaço no banco de trás não é demasiado pequeno, pois os sistemas de segurança passiva da altura não ocupavam tanto espaço como hoje.
Qualidade não era tema
As portas são finas e sentem-se leves, quando puxei a do lado do condutor. O painel de instrumentos tem seis mostradores analógicos de agulhas, pintados a cor-de-laranja. Um deles é o da pressão do turbo, como não podia deixar de ser.

O tablier é feito de plástico que parece um pouco frágil, pois na altura a qualidade dos interiores não era tema de conversa em modelos deste segmento. Há alguns botões na consola e uma prateleira aberta sobre o porta-luvas.
Motor 1.4 turbo
Em termos técnicos, o R5 GT Turbo tem um motor 1.4 turbo com intercooler de 115 cv e uma caixa manual de cinco relações. Hoje, parece pouco, mas era o padrão da altura e chegava, tendo em conta que o peso era de apenas 830 kg. Um Clio 1.3 TCe de 140 cv pesa hoje 1115 kg.

Bastou rodar a chave, ouvir o ronco do quatro cilindros e engrenar a primeira velocidade para sentir que este R5 GT Turbo era mesmo um carro “novo”, 36 anos depois de ter saído da fábrica, em 1985.
Todos os comandos precisos e “justos”, sem folgas, como qualquer carro novo. A caixa pode não ser um exemplo de rapidez, mas era mesmo assim, tal como o tato dos pedais.
Direção sem assistência
A direção, sem assistência e por isso com uma desmultiplicação que já não se usa, foi o primeiro aspeto que denunciou a idade do R5 GT Turbo, pois exige movimentos amplos e alguma força para tirar o carro do estacionamento.

Mas, na pista, o feedback que dá das rodas da frente é excelente, nunca há nenhuma dúvida daquilo que estão a fazer. Tanto em termos de trajetória como de passagem de potência ao chão, que estava parcialmente molhado.
Não era dia para heróis. Não queria ficar na memória dos homens da Renault Classic como o “idiota” que exagerou e bateu com o imaculado R5 GT Turbo nos rails da pista…
“Aproveita o carro”
Ainda assim, fui incentivado a andar depressa e a “aproveitar o carro” como me dizia um dos curadores do património histórico da Renault, que me acompanhou no banco do lado.
A marca anunciava uma aceleração 0-100 km/h em 8,0 segundos, um valor muito bom na altura e ainda hoje muito respeitável. Para comparação, o referido Clio 1.3 TCe de 140 cv anuncia hoje os 0-100 km/h em 9,4 segundos.

O R5 atingia os 201 km/h, o que os condutores da segunda metade dos anos oitenta confirmavam com regularidade nas autoestradas da Europa. Hoje, levar o Clio aos 205 km/h é só para quem tem muita “fé” que não vai encontrar um radar.
À espera do turbo
Claro que o motor 1.4 turbo de 1985 nada tem a ver com o motor 1.3 turbo de 2023. No R5 GT Turbo, o motor disponibiliza o binário máximo de 165 Nm às 3750 rpm.

Por isso tem uma resposta progressiva e linear, mas só acima das 3000 rpm, quando se começa a sentir o efeito do turbocompressor. Mas, como o peso é baixo e a caixa está bem escalonada, é fácil manter esse regime.
Acelerar o ritmo
Um par de voltas guiadas a um ritmo mais elevado, explorando bem o motor, a travagem e a suspensão, serviu para confirmar que o R5 GT Turbo tem um comportamento muito eficaz.
Curva de forma “plana”, com pouca inclinação lateral em curva e poucos movimentos longitudinais, quer nas travagens fortes, quer nas acelerações a fundo.

O carro sente-se bem apoiado nas quatro rodas, com os esforços bem distribuídos e sem que uma desaceleração na entrada em curva atire de imediato a traseira para uma deriva precipitada. Pelo contrário, mesmo com piso húmido, a sensação foi sempre a de ter um acerto neutro e estável, que inspira confiança.
Conclusão
Se, ainda nos nossos dias, um exemplar bem cuidado do Renault 5 GT Turbo impressiona pela qualidade da dinâmica e pela força do motor, imagino o que seria no final dos anos oitenta. Se o Grupo Renault conseguir transferir para o Alpine A290 nem que seja uma percentagem do envolvimento que a condução do seu antecessor tinha, já terá feito um bom trabalho.
Francisco Mota
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