A Nissan não quer nada com híbridos “plug-in”. Diz que é uma tecnologia cara e que os condutores não a usam bem. Em vez disso, propõe uma solução diferente, o e-Power. Já guiei um protótipo do Qashqai equipado com esta tecnologia e explico tudo neste primeiro teste.
Estava eu no circuito de Jarama e os homens da Nissan tinham acabado de apresentar o Juke híbrido e o Qashqai e-Power. O primeiro partilha a solução híbrida da parceira Renault, na Aliança Renault/Nissan/Mitsubishi, usada no Captur E-Tech Hybrid.
A segunda é uma importação direta do Japão, onde tem sido usada com sucesso em vários modelos, com destaque para o Nissan Note.

Perguntei por que razão não usavam antes a variante “plug-in” do sistema híbrido E-Tech da Renault…
Para minha surpresa, tinha acabado de tocar num assunto sensível. Já se sabia que o sistema e-Power vem para tomar o lugar dos motores Diesel, que o Qashqai deixou de oferecer, mas não julgava que a Nissan tinha uma opinião tão negativa acerca dos “plug-in”.
“Plug-in”?… nem pensar!
Apesar de a sua parceira francesa da Aliança ter esta solução disponível no Captur e no Megane, nas versões E-Tech Hybrid Plug-in, a verdade é que os técnicos da Nissan nem querem ouvir falar disso.
Ao contrário dos seus parceiros europeus, os japoneses da Nissan não acreditam nos “plug-in”, nem mesmo em produtos talhados especificamente para a Europa, como é o caso do Qashqai, feito no Reino Unido.

Em resposta à minha pergunta “e então os plug-in?…” os responsáveis da Nissan puxaram da lista de razões para rejeitarem este tipo de híbridos e começaram a enumerar as quatro que os levaram a tomar a decisão de não ter “plug-in”.
As quatro razões do “não”
Em primeiro lugar, é uma opção cara. Em segundo lugar, os condutores não usam os “plug-in” como devem, ou seja, não carregam a bateria todos os dias. Em terceiro lugar, consideram que se trata de uma solução transitória até à generalização dos 100% elétricos. Em quarto lugar, o custo de utilização dos “plug-in”, com a bateria descarregada, não é rentável.
A tecnologia já estava desenvolvida pela Renault – seria “só” aplicá-la ao Juke ou ao Qashqai para aumentar as sinergias…
Com este manifesto, a Nissan evita um investimento que decerto vai aplicar nos 100% elétricos. Mas não deixa de ser uma decisão curiosa, pois a tecnologia já estava desenvolvida pela Renault – seria “só” aplicá-la ao Juke ou ao Qashqai para aumentar as sinergias.
A preferência foi para o sistema e-Power que equipará uma das versões do mais recente Qashqai durante os próximos 5 a 6 anos, antes de o modelo passar também a ser 100% elétrico.
Como ficam as sinergias?…
Também não está previsto que a Renault venha a usar o e-Power do Qashqai, que foi adaptado para o mercado europeu com base no princípio de funcionamento daquele que é usado no Japão.
Novamente, pode parecer estranho que duas marcas da mesma Aliança tenham duas soluções diferentes para o mesmo segmento. Mas a rentabilidade do sistema e-Power já estará garantida com as unidades vendidas no Japão, onde o Note e-Power chegou a ser o modelo mais vendido.
O que é o e-Power
Mas então do que se trata este e-Power?… Na verdade, é um sistema híbrido em série, composto por um motor a gasolina e um motor elétrico. A diferença para os outros híbridos (ditos em paralelo) é que o motor a gasolina do e-Power nunca faz mover as rodas diretamente.
Posicionado sob o capót do Qashqai, o seu papel é o de acionar o gerador elétrico que carrega a bateria. Esta energia é depois usada para alimentar um motor elétrico que é o único responsável por dar movimento às duas rodas dianteiras, as motrizes.

Por outras palavras, a tração é sempre elétrica, como num 100% elétrico. O motor a gasolina só serve para gerar energia, por isso funciona a regimes que são, em parte, independentes da posição do acelerador.
Adaptado para a Europa
A adaptação do sistema para a Europa teve a ver com o dimensionamento e a potência, que tiveram de subir para ir ao encontro daquilo que se espera de um Qashqai. Por isso o motor a gasolina passou de um 600cc com 62 kW (84 cv) acoplado a um elétrico de 95 kW (129 cv); para um 1498cc de três cilindros, com 116 kW (158 cv) e um elétrico de 140 kW (190 cv).
Mas o três cilindros 1.5 não é um motor comum, pois tem sistema VCR, ou seja, variação contínua da taxa de compressão, através de um mecanismo agregado às bielas. Consoante a carga a que funcione, pode variar a taxa de compressão entre 8:1 e 14:1, ganhando em eficiência.
O Qashqai e-Power acelera dos 0 aos 100 km/h em 8,5 segundos
O motor elétrico de 140 kW (190 cv) e 330 Nm de binário máximo é o único que coloca força nas rodas, dando ao Qashqai e-Power uma aceleração 0-100 km/h de 8,5 segundos, atingindo os 160 km/h de velocidade máxima.
Uma “gincana” em Jarama
Este primeiro teste decorreu no histórico circuito de Jarama, perto de Madrid, mas na pista foram desenhadas curvas e rotundas com cones, para simular troços de cidade (com sinais de Stop e tudo), de estrada e de autoestrada: um pouco mais do que uma gincana.
Em termos visuais, o Qashqai recebe uma nova grelha com o novo logótipo da marca, comum a todos os Qashqai de 2022, além dos logótipos e-Power. Por dentro, há um novo ecrã tátil de 12,3” com novo software, novos gráficos e novo comando por voz.

Mas nada disto foi fotografado, pois, segundo a Nissan, a versão que guiei ainda não era a versão final com todos os acabamentos definitivos.
A plataforma CMF-C já estava preparada para esta versão, que leva uma bateria de 2,1 kWh (1,85 kWh úteis) sob o piso da mala. Na consola há um botão para os três modos de condução: Eco/Normal/Sport.
A alavanca da transmissão tem as posições P, R, N, D e a B para maior regeneração na desaceleração. Há também um botão EV, para forçar o funcionamento 100% elétrico, que é aliás a maneira como o e-Power arranca.
Suave, mas ruidoso
Muito suave e sem barulho, como se espera de um bom motor elétrico, o sistema tem força suficiente em modo elétrico para se fazer à estrada com vontade. Claro que o sistema não está pensado para funcionar em modo 100% elétrico durante muita distância seguida. Os engenheiros da Nissan estimam que esse exercício possa durar 6 km, depois de um arranque com a bateria bem carregada.
No modo Eco, a estratégia do sistema é de mínima regeneração, deixando a inércia funcionar e colocando o motor a gasolina a rodar a alta compressão. É quando se acelera mais, que o motor a gasolina entra em ação, num registo estacionário.

Nesta unidade pré-série que guiei, a insonorização do motor a gasolina não era perfeita, ouvindo-se muito ruído dentro do habitáculo, sobretudo acelerando para sair das rotundas falsas, altura em que sobe de rotação e passa a baixa compressão.
E o som também não é muito agradável ao ouvido, mais parecendo um motor com transmissão de variação contínua. É verdade que, quanto mais se acelera, mais o motor a gasolina sobe de regime, mas não de uma maneira direta e proporcional.
Facilidade de condução
E este som do motor a gasolina acaba por distrair daquilo que é o mais importante, que é a resposta linear e suave do motor elétrico. Apenas com tração à frente e uma única velocidade, o binário de 330 Nm consegue até fazer as rodas da frente perder por momentos a tração.
Passando ao modo Sport, a capacidade de aceleração é muito boa e o nível de regeneração adequado, sobretudo usando o modo B, com uma desaceleração próxima da função “one pedal”.
A dinâmica do Qashqai não parece ter sofrido grandes alterações, se bem que este primeiro teste foi muito curto para tirar todas as conclusões. A direção está razoavelmente bem assistida e os travões não são difíceis de dosear, ao contrário do que acontece em vários híbridos.

A precisão de frente na entrada em curva é a mesma dos outros Qashqai, razoável para um SUV deste tamanho, tal como a inclinação lateral. O ESC mantém a traseira muito estável, mesmo quando provocada.
Uma dinâmica que dá prioridade ao conforto, como seria de esperar de um Qashqai. Mas foi precisamente este o ponto mais difícil de aferir na pista super-lisa do circuito de Jarama. Também por confirmar ficou o consumo misto anunciado de 5,3 l/100 km.
Conclusão
Tudo depende do preço, ainda não definido, para saber qual será a recetividade do Qashqai e-Power, quando chegar ao nosso mercado em Julho. Uma coisa é certa, as empresas que o comprarem, não vão usufruir das benesses que o Estado dá aos “plug-in”.
Francisco Mota
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