No Inverno de alguns países, ter um carro de tração às quatro rodas pode ser a diferença entre conseguir utilizá-lo ou ter que o deixar parado. A Alfa Romeo sabe disso e criou uma versão Q4 do seu B-SUV Junior. Neste Primeiro Teste, conduzido por Francisco Mota, o Junior Q4 superou as expetativas.
Um engano no trajeto definido no sistema de navegação – que fiquei sem saber se foi meu erro de leitura ou do próprio sistema na escolha entre vários caminhos – levou-me para uma estrada de terra que começava com piso duro e algumas pedras, nada de especial. A seguir a uma lomba, ao fundo da descida, uma enorme zona de lama e água levou-me a parar para analisar a situação: seria mesmo por alí o trajeto? Seria o Junior Q4 capaz de ultrapassar esta zona de lama com regos relativamente fundos? Havia sinais de ter por alí passado um carro há pouco tempo, por isso arranquei e mergulhei na lama com alguma cautela. As rodas da frente perderam tração, começaram a patinar e o Junior Q4 parou. Fiz marcha-atrás e o motor traseiro elétrico ajudou a puxar o Q4 para trás, subida acima. Continuei a acreditar que o caminho era o certo e tentei outra vez, agora com mais velocidade. O Q4 entrou bem mais depressa no lamaçal, com a proteção sob o motor a deslizar na lama e as quatro rodas a esgravatar até chegar ao outro lado, a terra firme. Duvido que um sistema mecânico simples pudesse ter feito melhor, o binário máximo a baixa velocidade foi o segredo para o motor traseiro elétrico conseguir tirar o Q4 desta situação limite.

Continuei a subida seguinte, com solo duro mas escorregadio até que, a seguir a outra lomba me deparei com um mar de lama com várias dezenas de metros. Havia marcas de por ali terem passado veículos, mas de certeza nenhum Junior Q4. Este Alfa Romeo não teria a mais pequena hipótese de navegar aqui e conclui que estava mesmo errado no percurso, manobrei com cuidado para voltar para trás e ataquei novamente a zona de lama com mais velocidade, com o Q4 a mostrar que estava nos limites das suas capacidades, perdendo velocidade a uma taxa alarmante, mas conseguindo chegar a terra firme. Se queria uma prova concreta das capacidades do novo sistema de tração às quatro rodas do Junior, esta experiência foi conclusiva.
Não é para nós…
Não acredito que um comprador comum de um Alfa Romeo Junior Q4 submeta o seu carro a este tipo de utilização. Não foi para isto que foi concebido, mas antes para circular em estradas nevadas nos países do Norte da Europa. Ou para chegar a uma estância de desportos de Inverno com maior facilidade e segurança. Não é uma versão que faça falta num país como o nosso, não é para nós, mas é indiscutível que, em pisos muito molhados pelas chuvas, oferece uma dose extra de segurança.

Mas como foi que a Stellantis fez um sistema 4×4 para um veículo do segmento B-SUV, com uma plataforma pensada para ter apenas tração à frente? Tudo começa com a versão Ibrida, um “mild hybrid” que usa o conhecido motor 1.2 turbo de três cilindros da Stellantis com 136 cv, acoplado a uma caixa automática de dupla embraiagem e seis relações, dentro da qual está um motor/gerador elétrico de 21 KW (28,6 cv). Até aqui nada de novo. A novidade está na instalação de um segundo motor elétrico no eixo traseiro, também com 21 KW, um diferencial com uma relação redutora de 22,7, que confere um binário às rodas traseiras de 1900 Nm e uma bateria de 0,42 kWh úteis sob o banco do condutor.
Muitas modificações
Com este conjunto, a potência máxima combinada sobe aos 145 cv. A introdução do motor elétrico para mover as rodas traseiras obrigou a trocar a suspensão traseira de barra de torção, do Ibrida, por uma suspensão multi-link, a primeira vez que esta plataforma recebe uma. O acréscimo de peso e de tração levou a mudanças também nas molas, nos amortecedores e nas barras estabilizadoras. Com tudo isto, a Alfa Romeo garante que reduziu a tendência subviradora em 30%, face ao Ibrida, autorizando maior aceleração lateral.


Os modos de condução disponíveis são os conhecidos Advanced efficiency, em que o motor elétrico traseiro só é usado se for preciso; o modo Dynamic, que só usa o motor traseiro até aos 40 km/h, o modo Natural e o novo modo Q4. Neste modo, a tração mantém-se permanente às quatro rodas até aos 30 km/h, entre os 30 km/h e os 90 km/h é usado o motor traseiro se necessário e acima dos 90 km/h só tem tração à frente. Para garantir que há sempre energia para o eixo traseiro, o motor/gerador elétrico dianteiro pode carregar a bateria em aceleração, não apenas regenerar em desaceleração, naquilo a que a Alfa Romeo chama Power Looping Technology.
Atribuição de binário
Não há nenhuma ligação físíca entre o eixo da frente e o de trás, a atribuição de binário a cada eixo é feita pelo software do sistema. Por exemplo, em modo A, o máximo que o eixo traseiro recebe é 50% do binário total. Mas no modo Q4, pode chegar aos 100% para trás, quando o eixo da frente estiver a patinar sobre uma placa de gelo, por exemplo. Ou de lama…



Por dentro, o Q4 pouco se distingue da versão Ibrida a não ser por detalhes decorativos. Continua a ter um boa posição de condução, com bons bancos do fornecedor Spiga e volante de boa pega. Um painel de instrumentos em forma de binóculo, como os Alfa antigos e um ecrã tátil de 10,25” relativamente fácil de usar. Alguns materiais do interior deveriam ser melhores, sobretudo os do topo do tablier, mas a decoração disfarça bem. A habitabilidade na segunda fila é razoável e a capacidade da mala desceu dos 415 aos 340 litros.
Menos subviragem
O Q4 pesa mais 195 kg que o Ibrida e notei isso bem numa boa estrada secundária de asfalto, no Norte de Itália, sobretudo em termos de acelerações máximas, com o Q4 a fazer os 0-100 km/h em 9,1 segundos, enquanto o Ibrida demora 8,9 segundos. Contudo, o Q4 compensa isso com uma maior facilidade de limitar as saídas de frente. Claro que acabam por ocorrer, se a entrada for exagerada. Mas num ritmo um pouco abaixo do limite dos pneus 215/55 R18, percebe-se que o Q4 faz rodar o Junior durante a curva de forma bastante eficiente, com o contributo da suspensãso traseira independente. Mas não se espere sobreviragem à saída de curvas lentas, nem sequer vontade de aceitar provocações para fazer derivar a traseira.



O motor também prefere rodar a regimes um pouco abaixo do máximo. Em vez de gritar e parecer que não avança muito, com um pouco menos de rotação, ronrona e mantém um ritmo desenvolto e rápido, até porque há um certo tempo de resposta do acelerador, mesmo em modo Dynamic. As patilhas podem bloquear-se em modo manual e respondem com rapidez e obediência suficiente, mais uma vez, preferindo uma condução um pouco abaixo do máximo.



Numa toada mais tranquila, pelo meio das povoações, a sensação de bom binário a baixo regime (230 Nm) é semelhante ao Ibrida, o modo automático da caixa funciona sem indecisões e o conjunto suspensão/pneus proporciona um bom nível de conforto, sem perder nada em controlo. O sistema híbrido é capaz de mover o Q4 em modo elétrico a baixas velocidades, tipicamente no para-arranca, durante pequenos períodos.
Conclusão
Neste Primeiro Teste TARGA 67, não tive tempo para aferir consumos mas a marca diz que o consumo médio WLTP sobe dos 4,8 para os 5,2 l/100 km face ao Ibrida. No final, confirmei aquilo que pensava, que o Junior Q4 não é uma versão vocacionada para o nosso mercado. Ganha-se pouco pelos 7 400 euros que custa a mais. Contudo, os engenheiros da marca disseram-me que este sistema pode evoluir em vários sentidos, sorrindo quando lhes perguntei se um Elettrica Veloce Q4, uma hipotética versão AWD do elétrico de 280 cv, estaria nos seus planos.
Alfa Romeo Junior Ibrida Q4
Potência: 145 cv
Preço: 37 000 euros
Veredicto: 3,5
Ler também, seguindo o Link: Primeiro Teste – Alfa Junior Elettrica Veloce: tinha que ser