Muitas marcas viraram as costas aos Diesel e o mercado também o começou a fazer. Mas em Hiroshima há um grupo de engenheiros que não pensa como a maioria e decidiu lançar um novo motor a gasóleo. Os argumentos são os de sempre: baixos consumos e muito binário, mas será que isso ainda faz sentido? Descubra no Teste TARGA 67 ao Mazda CX-60 3.3 e-Skyactiv D.
Sempre que existe uma possibilidade de seguir um caminho diferente da maioria, a Mazda não hesita em segui-lo, se entende que pode ganhar vantagens com uma opção técnica diferente. Claro que nem todas resultaram em pleno, como é o caso do famoso motor rotativo Wankel.
Desde que comprou os direitos deste motor único em 1962 – um conceito inventado pelo alemão Felix Wankel em 1924 e incialmente usado pela NSU a partir de 1957 – a Mazda teve uma relação profunda mas intermitente com esta tecnologia que todos os outros abandonaram.

O último motor Wankel produzido pela Mazda data de 2012, mas este ano vamos voltar a falar dele numa versão com extensor de autonomia do elétrico MX-30. Teimosia, ou persistência é difícil perceber onde está a razão.
“Right sizing”
Outro exemplo é o “right sizing” em vez do “downsizing” em que a Mazda continua a preferir oferecer motores atmosféricos a gasolina, de cilindrada mais elevada, do que pequenos motores com turbcompressores. Mais uma ideia fixa.

Claro que, algumas destas e de outras opções, são ditadas por orçamentos de desenvolvimento mais pequenos do que os de outras marcas de maior dimensão. Ainda assim, a marca defende as suas ideias com um argumentário bastante sólido.
E agora temos mais um caso destes com o lançamento em 2023 de um novo motor Diesel. Numa altura em que algumas das marcas que ainda os produzem anunciam não querer investir nem mais um céntimo nesta tecnologia, devido à descida da procura, a Mazda faz o oposto.
Diesel 3.3 novo em 2023
E não se trata de um motor pequeno ou médio, é mesmo uma unidade de seis cilindros em linha montado longitudinalmente, com 3,3 litros de cilindrada, caixa automática de oito e tração atrás: algo que não surgia de novo no mercado há muitos anos.

Com 4,745 metros de comprimento, o CX-60 alinha-se com o BMW X3, só para dar um exemplo de um SUV que também está disponível com a mesma arquitetura e implantação de motor Diesel.
Com alguns “segredos”
Mas a Mazda não fez um Diesel banal. Tem as características básicas, como turbocompressor de geometria variável, injeção direta elétrica common rail e intercooler. Mas acrescenta algo mais.
Para começar, junta um sistema micro-híbrido de 48 Volt com 153 Nm de binário máximo e 17 cv/900 rpm, que dá uma ajuda nos arranques e a muito baixas velocidades.

Mas tem ainda aquilo a que a Mazda chama DCPCI (Distribution-Controlled Partially Pre-mixed Compression Ignition) confirmando que a paixão dos japoneses por siglas, ainda não esmoreceu.
Dois ovos por cilindro
Trata-se de um processo de preparação da mistura gasóleo/ar mais homogénea, que permite fazer a combustão a temperaturas mais baixas. A Mazda usa câmaras de combustão na forma aproximada à de dois ovos, para conseguir este efeito, aumentando a eficiência acima dos 40%.

Temperaturas mais baixas equivale a menores perdas térmicas e isto permite reduzir consumos e emissões, nomeadamente de NOx e partículas, que são o ponto fraco dos motores Diesel. Esta é a teoria, resta saber se funciona na prática.
Tudo novo
O CX-60 estreia uma nova plataforma e também estreou uma nova motorização PHEV, além de estar disponível com tração atrás ou às quatro rodas. O Diesel tem uma versão AWD de 254 cv e a RWD de 200 cv deste teste.

O estilo segue aquilo que conhecemos da Mazda, com uma elegância e uma identidade muito próprias, aqui com a grelha perfeitamente vertical e o capót longo, para lhe dar um ar mais possante. Talvez a zona traseira seja demasiado conservadora e o perfil um pouco simplista, para um Mazda.
Quase premium
O habitáculo aproveita bem as dimensões exteriores e dispõe de bastante espaço nos lugares da frente. Na segunda fila, também há espaço mais que suficiente para dois, ou mesmo três, adultos viajarem com conforto. A mala tem 570 litros, que é um bom valor, ligeiramente acima do X3.

A qualidade dos materiais a bordo é boa, com acabamentos que lhe dão um ambiente quase premium. O ecrã central está no topo da consola mas tem pouca altura, sendo controlado por um comando rotativo na consola, como é hábito (mais uma teimosia…) da marca.

A posição de condução é alta, mas a colocação relativa do banco confortável, do volante de boa pega e dos dois pedais da caixa automática de oito foi bem pensada. A Mazda costuma acertar nas posições de condução e acertou mais uma vez.
Ergonomia imperfeita
Contudo, a condução em cidade exige algumas cautelas, porque as dimensões do CX-60 são grandes, o raio de viragem não é muito pequeno e a visibilidade não é perfeita, sobretudo para trás, sendo a câmara de marcha-atrás essencial.

A alavanca da caixa automática tem um disposição diferente das posições, com o P à frente, desviado para a esquerda e ao lado do R. O convencional é ter o P onde está o R, o que pode levar a situações embaraçosas…
Outra questão ergonómica que notei foi que, para ativar o stop/start quando se para no trânsito, é preciso carregar com demasiada força no pedal de travão, caso contrário não se usufrui de parte dos benefícios do sistema de 48 Volts. A própria progressividade do pedal deixa a desejar.
Suspensão desconfortável
Em cidade, a resposta do motor é muito suave e imediata desde baixos regimes, quase sem vibrações, provando mais uma vez o equilíbrio intrínseco dos motores de seis cilindros em linha. A caixa não é tão suave em algumas situações de trânsito, mas entra em “bolina” com frequência, poupando combustível.

A direção vai contra a norma do momento, ao não ser demasiado assistida. Por mim, está bem assim, pois aumenta o “feedback” da condução, o que é útil mesmo em cidade.
A grande crítica vai para o inesperado desconforto da suspensão. As molas são macias, mas o amortecimento é muito forte e a tolerância longitudinal dos apoios é reduzida. Passar por cima de passadeiras elevadas, atira os ocupantes para cima e para baixo com alguma violência. Pisos irregulares geram solavancos.
Consumos baixos
No meu habitual teste de consumos em cidade, com A/C desligado e em modo de condução Normal, obtive um valor de 6,6 l/100 km. É um consumo bom, tanto mais que o peso desta versão é de 1891 kg.

Em autoestrada, circulando a 120 km/h estabilizados, o consumo que obtive foi de 5,9 l/100 km, mostrando como os motores Diesel (e este em particular) continuam a ser uma boa escolha para quem precisa de fazer viagens grandes com frequência.
A condução em autoestrada também sofre do excessivo amortecimento da suspensão, que se nota em movimentos verticais secos e desconfortáveis quando se passa sobre bossas ou depressões do piso. A parte boa é que os ruídos são todos baixos, seja os provenientes do motor, aerodinâmica ou rolamento.
Motor só tem 200 cv
Saindo para uma estrada secundária e passando ao modo Sport, ganha-se na resposta do acelerador mas os 200 cv neste terreno são menos impressionantes que os 550 Nm, em cidade. A aceleração 0-100 km/h demora 8,4 segundos, ainda assim com o motor a mostrar vigor até para lá das 4000 rpm e sempre com um som agradável ao ouvido.

A caixa automática tem patilhas no volante, obedientes aos meus comandos, tanto a subir como a descer, o que aumenta o envolvimento na condução.
A distribuição de pesos pelos dois eixos não é anunciada, mas basta fazer algumas curvas mais depressa, para se perceber que deve andar perto do ideal. O CX-60 distribui bem os esforços pelas quatro rodas e não entra em subviragem demasiado cedo, quando se entra em curva com maior velocidade.
Dinâmica podia ser melhor
Deixando o ESC ligado, a atitude é bastante neutra, mesmo quando se exagera um pouco em curvas rápidas. Em encadeados, sente-se a transferência de massas laterais, provando que as molas da suspensão são macias, deixando aparecer uma inclinação lateral que lhe retira precisão.

Desligando o ESC, em pisos mais escorregadios e em curvas lentas, a tendência deste tração traseira muda para levemente sobrevirador. Em aceleração progressiva, é a traseira a deslizar primeiro, o que pode ser divertido, para quem gosta deste tipo de comportamento.

Para quem gosta muito, vai chegar a um ponto em que a roda traseira interior à curva começa a fazer efeito diferencial, sobretudo em curvas lentas, perdendo tração. Acaba por ser melhor deixar o ESC ligado.
Conclusão
A teimosia da Mazda em desenvolver um motor Diesel nesta altura prova ser acertada em termos de consumos e de agradabilidade de condução. O CX-60 tem também no habitáculo um ponto forte, tanto em qualidade como em espaço. Mas a suspensão está a precisar de maior desenvolvimento, pois mostra-se dura, quando devia ser confortável e macia, quando devia ser mais controlada. Com preços a partir dos 66 058 euros, para a versão menos equipada, esta versão Diesel do CX-60 merece atenção.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
Mazda CX-60 3.3 e-Skyactiv D 200 cv
Potência: 200 cv
Preço: 66 058 euros
Veredicto: 3,5 (0 a 5)
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Primeiro teste – Mazda CX-60 PHEV quer ser rival de X3, Q5 e XC60