Na Mazda, um “restyling” confunde-se algumas vezes com um “model year”. De um ano para o outro, muda sempre alguma coisa e não são só as jantes e as cores. O MX-5 2022 é o último exemplo disso, mas será que era mesmo preciso mudar alguma coisa?
Vou direito ao assunto: Kinematic Posture Control, ou KPC, é a grande novidade da edição 2022 do Mazda MX-5. O que é isto, para que serve, como funciona e se era mesmo preciso são as perguntas a que vou tentar responder nos próximos minutos de leitura. Fique por aí!…
Mas ir direito ao assunto é ir contra tudo aquilo que o MX-5 representa, um roadster que dá muito mais importância à viagem, do que ao destino. Quanto maior for o desvio, melhor, sobretudo se incluir uma boa estrada secundária.

Apesar de as vendas continuarem a muito bom ritmo em todo o lado, por exemplo em França subiram 50% (!) em 2021, a verdade é que esta quarta geração de um modelo lançado originalmente em 1989, já vai com oito anos de mercado.
Por fora, pouco ou nada
Apesar da idade, o estilo foi tão bem desenhado em 2014 que continua perfeitamente atual. Claro que, o facto de não ter rivais diretos também ajuda a este ar “sempre jovem” sem necessidade de restylings dignos desse nome.

Mas a Mazda vai sempre fazendo alguma coisa, ano após ano. Desta vez aumentou o número de cores disponíveis para a carroçaria, para os revestimentos interiores e para a capota do “soft top”. Neste RF (Retractable Fastback) que testei, a última não se nota, como é óbvio.
O que é um RF?
O MX-5 RF é uma opção muito original. Tem um tejadilho rígido retrátil de acionamento elétrico e acrescenta uma tampa para o compartimento da capota que lhe dá um ar de teto “targa”. Na verdade, o conceito tem semelhanças com o do Porsche 911 Targa.

Fechado, é um coupé relativamente bem isolado. Aberto é um “targa” que recolhe o tejadilho e o vidro traseiro. Com os vidros laterais subidos, o habitáculo fica bem protegido dos turbilhões.
MX-5 é menor do que parece
Para quem nunca viu um MX-5 ao vivo, o que deve ser pouco provável, pois as várias gerações já acumularam 1,15 milhões de unidades vendidas, o roadster da Mazda vai surpreender pelas dimensões mínimas.

Tem só 3,92 m de comprimento, menos que um Renault Clio e a unidade que testei tinha pneus 195/50 R16. E isso dá mesmo uma boa referência do tamanho do MX-5, pois as jantes e pneus não parecem pequenas, em comparação com o resto do carro.
Muito “acolhedor”
Entrar no interior de dois lugares é uma experiência, por si só. O banco está rente ao chão, o tejadilho é muito baixo (1,24 m) e a porta pequena, o que obriga a fazer alguma ginástica para chegar à posição de condução.
Mas vale bem a pena. O volante não tem regulações amplas, mas está perfeitamente posicionado, perto da vertical. O banco é estreito e curto, mas não há espaço para mais e o corpo acaba por se adaptar a ir “entalado” entre o volumoso túnel central e a porta.

A alavanca da caixa está mesmo onde a mão direita vai à procura dela. Mas já lá vou à caixa…
O para-brisas parece muito vertical e próximo da cara, aliás, tudo está muito próximo.
Ergonomia clássica
O painel de instrumentos é analógico, com um estilo clássico que agrada ao primeiro olhar. O ecrã central está no topo do tablier, não é tátil e tem um prático e elegante comando rotativo na consola. Os botões da climatização estão a meio da consola, são grandes e fáceis de rodar.

O acabamento sem brilho da maioria dos materiais dá ao habitáculo uma sensação de maior qualidade do que realmente tem. Na utilização diária, a principal queixa é a falta de porta-objetos. Nem um porta-luvas existe, apenas um pouco prático “cofre” entre os encostos dos bancos.
Um motor sem turbo
O motor 1.5 Skyactiv-G de quatro cilindros não tem turbo, uma raridade nos nossos dias e cumpre a norma EU6 sem precisar de filtro de partículas. Arranca com o som de um motor a gasolina clássico, suave mas com um “cantar” que não é abafado pela sobrealimentação.

Embraiagem, acelerador e alavanca da caixa exigem ser tratados com atenção, para se fazer um arranque suave e para se conduzir em cidade sem soluços. Mesmo a andar devagar, o condutor já vai imerso na condução. Sente que tem de fazer “coisas”, não é o carro a fazer por ele.
A disponibilidade do motor a baixos regimes é apenas razoável. O binário máximo de 152 Nm só chega às 4500 rpm. Mas este MX-5 só pesa 1038 kg e isso ajuda muito. Em cidade não se sente falta de força, mas por vezes é preciso mais RPM para avançar.
Muito confortável
A suspensão desta versão Excellence Navi está claramente afinada para o máximo de conforto. Mesmo em pisos em mau estado, o MX-5 surpreende pela maneira como mantém os ocupantes livres de solavancos e de incómodos.

A direção está muito bem assistida e é rápida o suficiente para fazer da condução em cidade um pequeno prazer. Tanto mais que o consumo que registei no meu habitual teste foi de 7,2 l/100 km, em cidade. A este ritmo, o depósito de 45 litros chega para 625 km.
Estradista, também
Em autoestrada, o meu teste de consumos mostrou como o MX-5 pode ser um bom estradista. Com a sexta engrenada e o velocímetro a marcar 120 km/h, gastou 5,8 l/100 km, o que aumenta a autonomia para os 776 km.
Com os vidros subidos e o tejadilho descido, é perfeitamente possível fazer centenas de quilómetros sem grande desconforto: a suspensão ajuda, os auxílios eletrónicos à condução não são demasiado intrometidos e o motor ronrona através dos escapes de dupla saída.

Na verdade, a experiência é melhor com a capota aberta que fechada, pois deixam de se notar os ruídos aerodinâmicos gerados pela capota mal vedada, quando a velocidade sobe.
Saber usar o 1.5
Mas onde o MX-5 brilha é nas estradas secundárias. As mais estreitas e com mais curvas são as melhores, são as que têm a sua escala. Arranque a fundo em primeira e os 100 km/h atingem-se em 8,6 segundos. Nada de extraordinário, mas suficiente.

O que mais agrada não é a performance absoluta do motor é o seu caráter. Em vez das descargas de binário às 2000 rpm, tão típicas dos turbo, este 1.5 atmosférico obriga a descobrir os regimes ideais para cada altura.
O ideal é não o deixar cair das 3000 rpm, mas é claro que acima das 4500 rpm tem uma resposta mais enérgica e depois vive bem perto das 7500 rpm, antes do corte e após as 7000 rpm, quando entrega a potência máxima de 132 cv.
A caixa é um património
Claro que, com a subida de regime, sobe a emoção, mesmo a velocidades longe do exagero. As dimensões do MX-5 fazem ampliar todas essas sensações, proporcionando diversão, sem ser preciso altas velocidades.
Quando chegam as curvas mais exigentes, a diversão aumenta. A travagem é suficiente e os pedais estão bem colocados para fazer o clássico ponta-tacão e garantir extra suavidade. A caixa tem uma alavanca com um curso curto e um tato extraordinário.

Para a Mazda, esta caixa é um dos seus patrimónios, não por ser a mais suave e rápida do mercado, mas por ter um tato tão mecânico e uma utilização tão satisfatória. Muitas vezes, usa-se só pelo gozo. Só lhe faltava que a terceira fosse um pouco mais curta, para evitar o “fosso” para a segunda.
E como curva?
A distribuição de pesos, perto do 50% por eixo, permite depois aos pequenos pneus dianteiros resistir bem às rápidas entradas em curva, a que a direção direta convida. Claro que, a seguir o MX-5 tem uma pronunciada inclinação lateral, quando vai apoiado a curvar.

Nesta altura, quem gosta de guiar depressa, vai reclamar contra o excesso de transferência de massas e também com alguma torção da carroçaria aberta, que já tinha notado no empedrado da cidade, com um evidente trepidar da estrutura.
O que faz o KPC?
A parte do KPC vem logo depois. Não é nenhuma invenção da Mazda, é apenas um controlo de tração feito por via de impulsos de travagem na roda motriz interior à curva. Isto evita que a roda traseira do lado de dentro da curva patine e deixe por aí escoar parte da potência.
Na anterior versão com este motor 1.5, isso realmente notava-se, sobretudo em curvas mais fechadas e com estradas com maior inclinação transversal.

O efeito faz lembrar o de um autoblocante e chega para manter a tração presente, mesmo quando se acelera com mais decisão e quando a carroçaria vai mais inclinada. Qual o resultado em termos de dinâmica da condução?
Uma questão de aderência
Em piso com boa aderência, o MX-5 mantém-se relativamete neutro, mesmo com o ESC desligado, a tração atrás não recebe binário em quantidade e de forma suficientemente rápida para se poderem provocar derivas de potência em qualquer curva, só com o pé direito.
Em piso mais escorregadio, o caso muda de figura. É mais fácil quebrar a tração e gozar alguns “poweslides” que parecem acontecer em câmara lenta, dando todas as oportunidades de os controlar ao detalhe.

Com um pouco mais de ousadia, é possível fazer tudo de outra forma. Colocar a traseira a deslizar com uma travagem tardia, já com a frente a apontar para o vértice da curva; sentir a traseira a rodar por inércia e depois carregar no acelerador para levar a deriva até ao final da curva.
Basta rematar com um sorriso. Mas a suspensão macia pode tornar tudo isto menos progressivo do que o desejável, devido à pronunciada inclinação lateral.
Conclusão
O KPC veio realmente melhorar a tração do MX-5 1.5, mas, para quem goste de guiar um pequeno roadster depressa numa estrada adequada, seria bom ter a opção de uma suspensão desportiva que limitasse a inclinação lateral. Ainda assim, guiar este MX-5 1.5 RF é sempre uma experiência que recorda como a condução pode ser envolvente e satisfatória.
Francisco Mota
(fotos de João Apolinário)
Mazda MX-5 RF 1.5 Skyactiv-G
Potência: 132 cv
Preço: 33 745 euros
Veredicto: 3,5 (0 a 5)
Ler também, seguindo o LINK: